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Livros da guerra colonial

Miandica terra do outro mundo


segunda-feira, 7 de outubro de 2019

MEMÓRIAS DA MINHA VIAGEM PARA A GUERRA COLONIAL 1972 a 1974





No dia 12 de Novembro de 1972, embarquei para a região militar de Moçambique, num avião dos transportes aéreos militar até à cidade da Beira. Onde desembarquei, à minha espera estavam viaturas do nosso exército, para me transportar para a Unidade militar da cidade, onde estive à espera de embarque para outro destino. No dia 15 de Novembro, embarquei com o 1.º escalão, num avião fretado, com destino a Nóva Freixo. No mesmo dia fui transportado, para a estação dos caminhos-de-ferro, onde embarquei num comboio velho, puxado a carvão, que se encontrava lotado, por homens, mulheres, e crianças Africanas, de raça negra. Fiquei estalado na carruagem da frente, junto à locomotiva, onde seguia o arrebenta minas. Segui um dia de comboio, para percorrer os sete centos e tal quilómetros de via-férrea, com os soldados que iam junto ao rebenta minas, a fazer a protecção, iam constantemente aos tiros de G.3 todo o trajecto, eu era chéca vivi momentos de muita ansiedade, e medo, vi várias carruagens tombadas nas ravinas, junto da via-férrea até Vila Cabral, capital da Província do Niassa, conhecida na gíria da tropa, (ESTADO DE MINAS GERAIS). Daqui eu ainda percorri cerca de 12 horas, os 60 quilómetros que faltavam até Meponda, junto do lago do Niassa, estrada em que foram “picados,” todos os palmos de terra, que os rodados das bérlietes, haveriam de percorrer. A coluna chegou ao seu destino, desembarquei e me dirigi para a linda praia, onde vi a água do Lago do Niassa, muito limpa sentei-me, descalcei as minhas botas, para refrescar os meus pés, que estavam tão cansados, de imensas horas de viagem. A refulgência do astro rei, deixara de brilhar, sobre a linda praia, para dar lugar à escuridão da noite, vislumbrei um guarda-sol, construído em palha, onde jantei, a dita (ração de combate), o alimento que me acompanhou nesta longa viagem. Depois deitei-me sobre o areal da praia, debaixo do guarda-sol, onde adormeci com o som das ondas do lindo Lago do Niássa. 19 De Novembro de 1972, quando o sol, se declinava suavemente, como uma bola de fogo, sobre as cálidas águas do Lago do Niássa, vislumbrei junto do areal, uma lancha da marinha, para transportar mais uma companhia de militares, que iam povoar as densas e perigosas matas do Lunho. O veículo que me ia transportar, seguiu a sua marcha, abandonou aquele local, dando lugar não menos belo crepúsculo, que encontrei com lividez, a lancha baloiçava suavemente, sobre o atapetado manto, formado pelas águas do Niassa. Vi o rosto dos meus camaradas, debruçados sobre o tombadilho do veiculo, observando atónitos, a algazarra que recrudescia, à medida que se aproximava de uma outra praia, a quem lhe chamavam Metangula. O ar trépido estampado, no meu olhar, quando desembarquei para terra, vi os soldados já velhinhos, que ali se encontravam, com o seu camuflado, todo gasto e roto, transportando nas mãos, latas e garrafas de cerveja. Saltando de alegria, ao verem mais uma companhia de tropas, com o seu camuflado reluzente, acabados de chegar da Metrópole. Aqueles velhinhos, nos deram vários conselhos, e nos avisaram que o Lunho ficava a Noroeste do Niássa, era um sítio muito duro de roer. Contudo no meu íntimo uma perene esperança, confidenciou-me que o meu regresso seria uma incerteza. Aproximou-se a hora de abandonar aquele local, fui encaminhado para uma das viaturas, que formava já na picada. Uma coluna auto as viaturas, começaram abandonar aquele local, segui o seu destino por uma picada muito perigosa, que cheirava a trotil e a morte, onde vi soldados apeados, na frente das viaturas, com uns paus onde tinham, uns pequenos ferros afiados na ponta, fazendo a picagem, para detectar algum engenho explosivo. Passei por um aldeamento, a quem lhe chamavam de Nova Coimbra, vi várias palhotas ,onde viviam homens, mulheres, e crianças de raça negra. Vi um aquartelamento das nossas tropas, que à nossa passagem gritaram bem alto! chéka é pior que turra! vai para o mato vai para o inferno do Lunho. A coluna lá seguiu em marcha lenta, e já se notava a refulgência do astro rei, a deixar de brilhar sobre a picada, foi então quando vi um aglomerado bairro de latas, em chapas de zinco, e outras em artesanal, em blocos de cimento, e tijolos, cercado por matagal. A coluna chegou ao destino, desembarquei segui para o interior do aquartelamento, onde encontrei no seu interior, e exterior, repleto de militares, emprestava há aquele ambiente, um misto e policromia, quadro irradiado das fardas camufladas, onde o brilho da minha farda ainda reluzente envergada, no meu corpo, sobressaía das do “Kokuánas” (velhos) já desbotadas com muitos meses de uso. Tinha acabado de chegar, era chéka de todo, era a palavra que em Moçambique designava por maçarico, o novato, o recém-chegado. Estava no período de adaptação à guerra propriamente dita, até ali não passava de teoria, depois as coisas foi mesmo a sério, muito diferente de tudo o que eu tinha aprendido, durante meses de prática, no pacífico rectângulo Europeu. Agora era mesmo a minha vida que se encontrava em jogo. Os conselhos dos velhinhos, eram escutados atentamente, cada um procuravam tirar, destes conselhos o maior partido possível. “Velhinhos” eram os militares que nós chékas, íamos render às respectivas missões, e que já tinham muitos meses de guerra, e por isso muita experiência. Ouvi-los era um ato de muita inteligência, e pelo menos me poderia trazer alguma vantagem. Os heróis do arame farpado, limitavam-se a fazer as tarefas, que o Comandante da Companhia designava. 


O corneteiro, Bernardino Peixoto, à direita, no seu posto de sentinela
Eu Bernardino Peixoto tinha a especialidade de corneteiro, fui colocado, num grupo de combate fiz guarda à ponte do Lunho, fiz picagens para detectar minas e armadilhas, fiz protecção à pista de aviação, patrulhamentos, capinagens, e parti para o mato à procura do inimigo, para não se aproximarem, do bairro de latas. Ouvi as granadas do morteiro 82, a estoirar perto de mim. Mas a tropa era assim mesmo, manda quem pode, e obedece quem deve. A companhia de caçadores 41 41 os gaviões, foi colocada no pior buraco mais famoso do Niassa, havia elementos, que com a sua inteligência, passando a graxa ao chefe para se desenfiar da guerra, passando, uma verdadeira instância turística. A minha indignação, ia para além dos directamente visados nesta artimanha. O Lunho era um foco de civilização, onde se conseguia evitar a morte. No Lunho encontrei um conterrâneo, que era de São Paio Ermesinde, de nome “Carlos Outeiro” da Companhia de caçadores 33 92, companhia que eu fui render, que à minha chegada me abraçou, me conduziu à sua caserna, e me ofereceu a sua cama, e uma caixa em madeira, para eu colocar os meus haveres. Fiquei triste quando o meu conterrâneo, teve de abandonar aquele local, e seguir outro destino com os seus camaradas. Passados 45 anos, nos encontramos dia 08 de Abril de 2017, no Maia Shopping. Demos um grande abraço e conversámos relembrando todos estes momentos

2 comentários:

  1. Gostei de ler. Também passei por todos esses sítios excepto Meponda. No Lunho estive acantonado três meses ainda antes da construção desse aquartelamento. Estive em Nova Coimbra, em Vila Cabral e de Junho de 1965 a Fevereiro de 1966, em Metangula.

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  2. Cheguei a este blogue, quando procurava o emblema da companhia do meu pai e qual é o meu espanto que encontro um antigo colega. A descrição que faz, vai de encontro ao que o meu pai sempre me contou :)

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