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Livros da guerra colonial

Miandica terra do outro mundo


segunda-feira, 14 de dezembro de 2020

OUTUBRO DE 1964. MASSACRES EM: LIGOWOLA-MDIBUA-MATUMULA. DISTRITO DE NANGADE. (1º EPISÓDIO)

Uma investigação de MAMUDE OMAR BAISSA, Professor no distrito de Nangade, como homem da terra, quis saber, sobre os rumores de massacres perpetrados, na zona em 1964 pela tropa colonial.   Inéditosmas aconteceram em 1964. Ninguém ousou divulgar estes três campos de massacres de LIGOWOLA, MDIBUA e MATUMULA que ocorreram no território de NANGADE  no mês de Outubro de 1964. Tanto a FRELIMO como os colonialistas portugueses, nunca se pronunciaram destes macabros acontecimentos que não são uma ficção.                                                                         Eu ouvi na praça as pessoas idosas falando desses locais, por isso me despertou a atenção, naveguei na Net em todos os Sites sobre Nangade mas sem sucessos. Entendi que estes factos nunca e ninguém os reportou desde então. Procurei pessoas idosas que os narrem aos pormenores, pessoas idóneas gozando de uma boa sanidade mental, familiares das vítimas ou de povoados circunvizinhos aos da chacina.        

Mamude Omar Baissa
Por isso cito:                                                                                                                              Echa Saide Amisse Ligiwole, orfã de pai e mãe assassinados no local;                                  Daude Rachide Chuta e sua esposa Amina Achimo Amir, que são familiares de uma das vítimas no povoado de LIGOWOLA.                                                                                       Conversei com as senhoras:                                                                                                    Fátima Alfane Binamo Mapendano,  a orfão de pai e mãe, e a Fátima Ismael Mussa Licovele que perdeu a sua mãe Alima Zuber, segunda esposa do Alfane Mapendano e: Rachid Omar Ulad, único sobrevivente em MDIBUA. 
Rachid Ali Assumane Matamula, neto mais velho de  Assumane Matamula e Omar Maulide Cumbemba, sobrinho do  Assumane Matamula.
Em ambos os casos o VITOR OMAR AMUR é o testemunha por ser o conhecedor dos factos e acções de alguns nomes das vítimas e dos portugueses visto que pertenceu à tropa colonial portuguesa com a patente de Furriel.




















09 de Outubro de 1964

Os habitantes dos povoados de NAHACODAO, LIGOWOLA, NALEQUE, MWEYA e NAMUAVICA, realizavam as suas reuniões clandestinas da FRELIMO no período da tarde no meio do mato de NACHONGA, sob a orientação do Chairman ISSUMAIL MPACULO. Este recebia os cartões para os aeus membros e embebia-se da política da FRELIMO no povoado do NANTECA, um frelimista que ficava situado em Lilongo, dentro da Circunscrição de NANGADE, a Oeste do lago NANGADE, a Leste do lago LIDEDE e a sul do rio ROVUMA.
A localização do NANTACA foi entretanto estratégica pois ela possuía inúmeras vantagens sócio-políticas, uma das quais, facilitaria a sua fuga atravessando o lago LIDEDE para a outra margem que é MUEDA, ou atravessando o rio ROVUMA para TANZÂNIA , em casos de mandatos de sua busca e captura pelo Governo Colonial.
Aliás, a região de LILONGO foi a via principal que os guerrilheiros da FRELIMO usavam durante a luta de libertação nacional passando para o interior de MOÇAMBIQUE, ou indo à TANZÂNIA em busca de material bélico ou para tratamentos médicos.
Os temas fulcrais das reuniões clandestinas da FRELIMO eram a exigência desse movimento à independência nacional de Moçambique à semelhança da Tanzânia. Nelas comparavam a FRELIMO ao TANGANIICA AFRICAN NATIONAL UNION (TANU), como movimentos libertadores dos jugos coloniais, e ao EDUARDO CHIVAMBO MONDLANE com o JULIUS KAMBARAGE NYEERE, como seus legítimos dirigentes, respectivamente.
Os portugueses por serem homens renitentes, eles não cederão, por isso seremos obrigados a pegar em armas e lutarmos contra eles pelo o que é nosso. Profetizava o Chairman MPACULO.
Em NACHONGA vivia-se sempre na instabilidade entre a esperança e o medo. Os reunidos necessitavam de uma coragem pois esta não é a ausência do medo, mas sim, a certeza de que há algo mais importante que o medo. Não deviam desperdiçar a ocasião. Foi por isso que o orador fazia longas pausas para se certificar se a mensagem chegava em perfeitas condições aos ouvidos dos reunidos, e se as folhas das árvores filtravam melhor a sua voz.
Todos os presentes seremos chamados para esta gloriosa missão da vida ou morte. A verdade pode doer, destruir, ou até matar mas ela sempre será sempre a verdade. Concluiu o Charman.
Pelas 20 horas do dia 8 de Outubro de 1964, a tropa de BOERS sul-africanos e os OPVs do TENENTE XAVIER "NAMACHILI) (era sua alcunha) provenientes de NANGADE idos de MUEDA, pernoitavam no povoado de NAHACODAO. Instalaram o seu comando debaixo de uma grande mangueira onde habitualmente os seus residentes conversavam nas horas de lazer.
Montaram um dispositivo que não permitia aos residentes sair dentro das suas casas para fazer necessidades. Os cipaios FERNANDO NANGOLOLO. AFONSO LIPUQUE, AFONSO MPUNDANA, GASPAR TAPALI e PIUS SANDOCA faziam a ronda passando pelas vandas de casas alertando aos moradores que não saíssem fora para mijar ou defecar. Este truque salvou a população de NAHACODAO da morte, mas pagou com as torturas pela madrugada.
Foram acordados manhã cedo, escoltados, amarrados e concentrados num único alpendre onde decorreu o purgatório com cassatetes. Quando a dor não cabe mais no peito, transborda pelos olhos e o grito de choro é o atenuante da profundidade da dor.
Os habitantes do minúsculo povoado de NAHACODAO, Tais como o  Saide Usse, Abremane Ulade, Daude Rachide Chuta, Lichuedye, Suede Buchir, Amina Achimo Amir, Alima Buchir, Fato Ndumelo e outros, provaram a tortura por se recusar aos noctívagos, vulgo vanachilos.
É por esta razão que enquanto os leões não inventam as suas próprias histórias, os caçadores serão sempre os heróis das narrativas de caças.
Encolerizados por torturas que executaram, agora a tropa conjunta caminhava mais célere como nunca, em direcção ao povoado de LIGOWOLA.
Pelas 7 horas do dia 9 de Outubro de 1964 a tropa BOERS e OPVs concentra e amarra a população de  LIGOWOLA gritando "estão aonde os turras vanachilo e onde vive a FRELIMO". Estas perguntas não precisavam de resposta porquanto a missão era de chacinar.
O SELEMANE LIGOWOLA escapa amarrado e um tiro arrebenta as cordas e acelera a velocidade do fugitivo;
O BUANAIDE CHUPI alarmado com os tiroteios volta do mato a correr e um tiro lhe estoura oos miolos;
Ao ABDALA PUMA foi decapitado e a sua cabeça foi içada num mastro;
A ALIMA SELEMANE NAMONDE estava a tirar a água do poço quando foi assassinada com um tiro no local.
Quando a tropa saia a caminho de METAMBA DOS MACONDES, levaram consigo os irmãos ABASSE LIGOWOLA E SALIMO LIGOWOLA que foram executados a tiro a quinhentos metros desta povoação.
O bébé AMISSE SAIDE LIGOWOLA foi encontrado pela sua tia FATO AMISSE MAMBO, a ganir no colo de sua mãe  BITI AMISSE MAMBO assassinada à baioneta. Esta reanima o bébé com um duche e volta a correr para a sua povoação onde o curandeiro WANCALAVILE arranja ervas e raízes que induzem a lactação dos seios da tia estéril. AMISSE cresceu mamando os seios da BINTI MAMBO.
NAHACODAO,  e outras povoações da Comunidade de NCHEQUEDELA ficaram em apuros tendo-se refugiado para o mato ou para a TANZÂNIA ou posteriormente, para o aldeamento de NANGADE.
Cobardemente em 1972, o menino AMISSE SAIDE LIGOWOLE viria a ser patenteado a Cabo pelas tropas portuguesas, sem no entanto ter prestado qualquer serviço militar.~
O massacre de LIGOWOLA deixou profundas cicatrizes na memória colectiva da população de NANGADE.

EIS A LISTA DOS ASSASSINADOS EM LIGOWOLA
ABASSE LIGOWOLA
ABDALA PUMA
ALIMA SELEMANE NAMONDE
ASSANE SAIDE LIGOWOLA
ASSUMANE SAIDE LIGOWOLA
BINTI AMISSE MAMBO
BUANAIDE CHUPI
SAIDE AMISSE LIGOWOLA
SAIDE MRIPA
SALIMO LIGOWOLA

FONTES ORAIS:
DAUDE RACHIDE CHUTA
ECHA SAIDE AMISSE LIGOWOLA
AMINA ACHIMO AMIR
VITOR OMAR AMUR

15 DE OUTUBRO DE 1964
MASSACRE DE MDIBUA

Não levou um mês após o massacre de LIGOWOLA, sem que acontecesse um outro extermínio humano no povoado de MDIBUA, na comunidade de NCHELENGANI, a 8 Kms do Sudoeste da vila de NANGADE,
NANGADE acabava de receber um reforço de contingente militar português proveniente de MUEDA, comandada pelo Capitão SAMBANDA com a a missão de executar os nativos indiciados de colaborar ao movimento dos "turras". Acreditava-se que estes povoados seriam a retaguarda segura desse movimento.
No dia 15 de Outubro de 1964, o Capitão SAMBANDA faz uma patrulha pelas regiões baixas de NANGADE, ao longo do rio MBUIDE, afluente do lago NANGADE, na qual capturaram as senhoras ALIMA ISSA LICONDE,  ECHA MOMADE e FATO SAIDE que iam visitar seus familiares em NAMAPONDO. Com as capturadas galgam a montanha até à comunidade de NCHELENGANI onde são deixadas cativas no meio da estrada sob a vigia de três cipaios. Afinal as sequestradas vagueavam com sorte do anjo da morte.



Os militares seguiram o caminho que levava para o povoado de MDIBUA do MAPENDANO, 800 metros da estrada. Permaneceram horas esperando esperando pelo regresso dos seus habitantes dos seus afazeres, até que os nimbos se concentraram na abóbora celeste por cima de MDIBUA; estes sabiam que onde há malícia tem uma inocência apesar da morte não avisar quando vai chegar e cada um ter o seu dia para morrer. 
-- Eu fui enteada do ALFANE BINAMO MAPENDANO. nesse dia fui com a minha prima ao rio e já secávamos a roupa molhada ao sol quando ouvimos os tiroteios. As casas foram incendiadas depois da nossa fuga para NCHELENGANE do NCAMUCHINO.
Testemunho de:  FATO SUMAIL MUSSA LICOVELE.
Entretanto no massacre de MDIBUA salvaram-se misteriosamente apenas dois rapazes a tudo escondidos no povoado.
Trata-se do RACHIDE OMAR ULADE hoje com 61 anos de idade, residente da aldeia NGONGOLO em NANGADE, e sua prima ADIJA ALFANE, filha do tio, actualmente vivendo maritalmente na Tanzânia.











RACHIDE OMAR ULADE, sobrevivente conta como é que se salvou do massacre de MDIBUA.
-- A presença da tropa portuguesa de cerca de duas horas no povoado de MDIBUA, eu não via com bons olhos por isso tentei persuadir a minha mãe que refugiássemos no mato,ela não deu ao meu vaticínio, pois que não se levantou por estar de uma grávida grande. Alrtei-lhe das nuvens que se formavam no céu que trariam trovoadas fatais para ela, permaneceu estendida na esteira como uma baleia encalhada,
A tropa ia fazendo o levantamento e confirmação das presenças de casa em casa.
Convidei a prima que entrássemos dentro da casa pela porte traseira. A Adija entrou pela porta frontal, abriu a traseira, subimos ao tecto feito de bambús entretecidos e cobrimo-nos de uns sacos vazios que o pai recebera da Secretaria Colonial de NANGADE.
A tropa mandou os moradores que se retirem para fora das suas casas e iniciaram a barbaridade sem escrúpulos nem no entanto poupar a idade ou sexo. Numa fracção de minutos a povoação ficou deserta e ensanguentada.
E prossegue:
Quando incendiaram as casas o fumo engrossa as nuvens e choveu torrencialmente tendo-se refugiado todos nas varandas da casa em que estivemos escondidos. Depois da chuva cessar se retiraram mas ficou um desalmado que tentou incendiá-la mas desistiu porque o capim estava molhado. Descemos do tecto, contemplamos a carnificina no pátio e fomos a correr para nos esconder novamente no mato.
Andando novamente pela estrada a tropa deparava-se com indivíduos estranhos vindos de NANGADE
Quem são vocês? Identifiquem-se, caralhos. Rugiu uma voz militar.
Eu sou OMAR ULADE, Intérprete - Tradutor da Secretaria de NANGADE
Eu sou SAIDE ULEDE, mestre ajudante do alfaiate BACAR ARAMBA
Eu sou SELEMANE OMAR MPATILA, acompanhante do alfaiate
Deixem os macacos irem se lamentar dos seus turras do caralho. Resmunga outra voz roufenha. 
BACAR ARAMBA, foi um alfaiate sobejamente conhecido na comunidade visto que consertava fardamentos militares.
OMAR ULADE soltou um grito que estremeceu os mortos quando viu a sua esposa SIDAWA morta. Faltava-lhe saber do seu único filho RACHIDE. 
Ele vistoriou os corpos sem sucesso. Foi atrás da sua casa onde viu pegadas de dois meninos que se dirigiam ao mato. Chamou pelos seus nomes, estes responderam a escassos centímetros de onde terminaria a sua urina se mijasse, cobertos de "lidinguili" ou "nandulo", nomes que os macondes dão ao tipo de fibras bravias entrelaçadas com que apertam as suas casas.



















EIS A LISTA DOS ASSASSINADOS EM MDIBUA
ABDALA SAIDE
ADIJA RACHID
ALFANE BINAMO MAPENDANO
ALIMA ZUBER
AMADE MUSSA
AMINA BINAMO
AMISSE CHUPI
AMISSE ULADEASSINA BINAMO
ASSINA OMAR
ASSUMANE OMAR
BITI LIHINDA
FATO NDALE
FATO SEFO
FATUMA OMAR
HAWA ASSUMANE
LUQUIA MCHOCOLECA
MACHICHO LIAMBA
MASSUDE CHUTA
MASSUDE USSENE CANGULO
MOMADE SAÍDE
NAMPEMBE
NGONIA OMAR
NHAPULE OMAR
OMAR IMANE MAPENDANO
OMAR USSENE CANGULO
RACHIDE ABDALA
SAIDE MCHCOLECA
SAIDE RACHIDE
SAIDE SAIDE
SIDAWA TAIBOO
SIJAI OMAR
SOFIA ABDALA
SOFIA BUANIDE
SOFIIA OMAR
SUABO RACHIDE
TUICALILA OMAR
ZAINABO AMISSE 
ZAINABO SAIDE

FONTES:
FATO ALFANE BINAMO MAPENDANO
FATO 



MASSACRE DE MATUMULA 

24 de Outubro de 1964

 O povoado de Matumula ficava situado a Oeste da vila de Nangade, a Sul do lago Nangade e do rio Rovuma e a Sudeste do lago Lidede.

Matumula foi o centro de concentração, de passagem e de repouso dos transeuntes que vinham ou iam a "manamba", as plantações de sisal na Tanzânia. Neste cruzamento e aglomerado de pessoas vindas dos actuais distritos de Nangade, Mueda,Muidumbe, Macomia, etc., facilitou a infiltração e expansão de políticas da Frelimo. Foi inevitável pernoitar em Matumula, por isso este povoado passou a ser o ponto de referência, o mais habitado e movimentado ao nível da comunidade de Chicuaia. Aliás, a aproximação do Assumane Matumula ao Nantaca de Lilongo, um proeminente frelimista, acresceu às causas para invadir e destruir este povoado.

 A deterioração de relações conjugais entre o Ali Ussene de Litamana(actual aldeia Janguane)com a sua esposa Amina Assumane Matumula, constitui o motivo que ditou ao 3º massacre de Outubro 1964.

A MORTE DAS TRÊS MULHERES INOCENTES

Passados três dias após o massacre de Mdibua, 18/10/1964, confirmava-se a sorte final das três mulheres capturadas em Namapondo. As duas idosas deviam ser mortas apóis o pequeno almoço e a menina devia viver em liberdade incondicional no aldeamento de Nangade.

-Esta tarde iremos passar o cerol à tua mãe Alima Issa Liconde e essa outra desajeitada Echa Momade. Tu viverás incondicionalmente no aldeamento_Anuncia o cipaio-chefe Fernando Nangololo.

-Vossos imbecis sem coração! De que nos acusam para merecermos esta grosseira sentença? Eu não deixo minha mãe morrer sem mim. Não me envergonho com a minha inocência. A inocência da minha vida. Estarei tão feliz se for a morrer com ela. Cumpram a minha suprema vontade. Implora a rapariga Fato Saide.

O local de execução já estava identificado: nos decliveis ao lado Oeste da Residência do Administrador do Distrito. Mataram à queima roupa e lançaram ao fundo dos montes nas bocas das hienas.

Fonte: Hawa Abdala Ncamuchino.












              







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