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Livros da guerra colonial

Miandica terra do outro mundo


segunda-feira, 27 de agosto de 2018

VÍTIMA DE GUERRA

1º Cabo Radio Telegrafista Manuel Sousa
Sou Manuel Lopes de Sousa, natural de Espargo- Santa Maria da Feira e nasci em 2 de Novembro de 1944
Assentei praça em 25 de Outubro de 65 no G:A:C:A:3(grupo de artilharia contra aeronaves em Espinho.Finda a recruta foi destacado para o R:A:P3 na Figueira da Foz para tirar a especialidade de transmissões.Finda a especialidade foi para Queluz,R.A.A.F.,que ficava na parte norte do palácio de Queluz. Finda a especialidade foi-me concedida uma licença de 20 dias,mas ao fim de uma semana recebi um telegrama para me apresentar em 24 h. por motivo de mobilização.Chegado a Queluz fui enviado para o RAL1 para o BCART. 1881. Dias depois enviaram-me para o Depósito Geral de Adidos, na Calçada da Ajuda,onde aguardei embarque para Moçambique.
Embarquei no navio Príncipe Perfeito em 7 de Maio de 66, no Paquete só iam 20 militares, os restantes passageiros eram civis.tudo civis,viagem maravilhosa;Funchal,Luanda,Lobito,Cidade do Cabo e Durban na Africa do Sul e finalmente Lourenço Marques,onde esteve umas 3 semanas num quartel que ficava num alto.Depois no navio Angola;Beira,ilha de Moçambique e Nacala. Em Lourenço Marques fui colocado na CCS do BCAV 1879, que estava sediado em Metangula.Entre Nacala e Catur fomos de comboio,de Nova Freixo até Catur o comboio só andava de dia,dormi uma noite em Nova Freixo.Chegados a Catur,fui de machibombo (autocarro) até V.Cabral onde estive uns dias. Daqui seguimos em coluna auto até Meponda onde embarcámos numa lancha da Marinha até Metangula onde cheguei em fins de Junho de 1966.
Apresentei-me ao comandante da comp. e fui integrado na equipa de transmissões,éramos 9,fazia-mos escala nas saídas,um mês cada um.Calhou-me em Agosto de 66,tudo correu bem.Regressei a base até Março de 67,onde voltei a ser escalado.Nesses meses entre Agosto e Março fazia serviço no posto de rádio como radio telegrafista,e o resto do tempo eram banhos nas águas do lago.Em 4 de Março de 1967, uma Berliet e um Unimog saíram de Metangula com destino a Nova Coimbra, para levar o correio da CCAV. 1506 estacionada naquela localidade. A distância entre ambas era de cerca de 18 Kms. A meio do trajecto e bem perto da Missão Anglicana de Messumba fomos atacados com disparos de bazuka e de tiros de metralhadora. O atirado do LGF da Frelimo surgiu do mato e colocou-se em frente da Berliet e disparou atingindo-a em cheio
Foi como uma trovoada que caiu sobre nós. 
A Berliet ficou nesta estado, após a emboscada
Eu ia na Berliet , atrás vinha o Unimog. O pessoal que seguia na Berliet ou morreram ou ficaram gravemente feridos. Os que estavam no Unimog ripostaram ao fogo do inimigo o que provocou a sua fuga.Levaram-nos para Nova Coimbra e daqui fomos evacuados de helicóptero para Vila Cabral, onde permaneci uma noite. 
No dia seguinte fui enviado para o Hospital de Nampula, onde me disseram que tinha sido atingido com um tiro na coluna e estilhaços de bazuca no ombro esquerdo, tendo um deles  perfurado o pulmão esquerdo,onde perdi muito sangue.Posso agradecer por ainda estar vivo a um médico que estava em Nova Coimbra e me fez uma transfusão de sangue.
De Nampula foi enviado para o hospital Miguel Bombarda em Lourenço Marques,onde estive umas semanas até ser evacuado para Lisboa,Hospital Militar na Estrela.  Passados uns dias foi para o anexo em Campolide,onde estive 3 anos a recuperar. Já era casado e tinha uma filha,de tempos a tempos recebia a visita da família  e mais tarde quando comecei a melhorar era eu que vinha à terra visitar a família.
Quando finalmente fiquei recuperado, não dava mais, vim para casa, e a Junta Médica deu-me 100% de incapacidade e segui a minha vida. O Coronel Freire Damião comandante do meu Batalhão visitou-me no Hospital e ofereceu-me em Lisboa um curso de ourivesaria mas, eu preferi regressar à minha terra e retornar a minha profissão de sapateiro.
Montei em minha casa uma pequena oficina e foi graças a ela que sobrevivi até ao 25 de Abril de 1974, visto que era miserável a pensão que o Estado Novo nos dava. Com o 25 de Abril melhorou um pouco,mas não há dinheiro que pague a saúde.


Lisboa, Anexo do Hospital Militar a fazer fisístria
No anexo convivi muito com outros colegas mais velhos que eu,e fomos-nos mentalizando que o resto da nossa vida era passada numa cadeira de rodas.Felizmente tinha e tenho uma esposa e resto da família excelente que me ajudou em tudo,e hoje já velhote,73 quase 74 vou vivendo com as minhas limitações,mas tento viver o melhor que posso;Tenho carro,conduzo,fiz casa própria com as condições mínimas,e é assim a minha vida,não sou como antigamente se dizia um coitadinho,eu e os meus colegas que estão nas mesmas condições que eu,vivemos o melhor possível.
Sou Deficiente das Forças Armadas,vou muitas vezes ao Porto aos convívios e tenho assistência médica e medicamentosa no hospital Militar do Porto gratuita.Estive um ano em Moçambique,embarquei em 7 de Maio de 66 e regressei em 7 de maio de 67.

NOTA DO BLOG
A 4 de Março de 1967, (dia do acidente de guerra acima descrito) a CCAÇ 1558 desembarcou vinda de Meponda em Metangula. Daqui seguiu para Nova Coimbra para render a CCAV 1506. Em Nova Coimbra deparámos com a realidade da guerra, pelo chão jaziam mortos e muitos feridos, vitimados pelas emboscada feita minutos antes. No chão, muito ferido, encontrava-se o meu amigo de infância Gustavo, felizmente não morreu mas as marcas ficaram-lhe para a vida.
Presumimos que aquela emboscada estava preparada para a CCAÇ 1558 mas, aquela coluna saiu à nossa frente.
Deste acidente faleceram:
Da CCS do BCAV 1879
António Augusto Moreira  sepultado em Maniamba
Joaquim Soares Andrade sepultado em Vila Cabral (Lichinga)
Da CCAV 1505
Abel Amorim Rente sepultado em Carnaxide
Arnaldo Fernandes João sepultado em Vila Cabral (Lichinga)
José Almeida Lopes sepultado em Sátão
José da Silva Gomes sepultado em Vila Cabral (Lichinga)
DA CCAV 1506
Luís da Silva Aço sepultado em Benavila, concelho de Avis

Infelizmente e escandalosamente até 1967, as despesas com os restos mortais dos combatente portugueses, eram suportadas pelas famílias.



No dia 4 de Maio de 2018, no Regimento de Engenharia 3 em Espinho, reci a medalha de feridos em campanha. Foi um dia muito emotivo, trataram-nos muito bem. Ainda há quem se lembre de nós e nos respeitam.










segunda-feira, 20 de agosto de 2018

RUI VERGUEIRO,ALFERES MILICIANO: NO PÓS 25 DE ABRIL DE 1974 NO NIASSA

segunda-feira, 14 de abril de 2014


RUI VERGUEIRO,ALFERES MILICIANO: NO PÓS 25 DE ABRIL DE 1974 NO NIASSA


 TEXTO E FOTOS DE:,
 RUI VERGUEIRO, 


Eu, Rui Vergueiro era estudante de medicina quando o serviço militar obrigatório o foi resgatar à Faculdade de Medicina do Porto.

O alferes Rui Vergueiro, chefe das transmissões do Agrupamento 2000/72 no seu gabinete em Vila Cabral
Depois de cumprida a respectiva instrução na metrópole, seguiu para o norte de Moçambique como alferes miliciano de transmissões.
A minha unidade Com. AGRUP  2000/72 foi formada em Lisboa no RALI-1 e dela faziam parte:
Tenente Coronel Eduardo Jorge Gomes Coelho Picciocchi, comandante do Agrupamento, Majores Simões de Faria (operações), Abrunhosa (logística) Helder (acção psicológica), ficou instalada no quartel no Batalhão de Caçadores 20, em instalações separadas do Comando de Sector, comandado pelo então Brigadeiro Coito Graça, que estava em final de Comissão. O cargo seria ocupado pelo Brigadeiro Stadlin Baptista que foi saneado após o 25 de Abril.
 O seu destino foi a província do Niassa, no extremo norte de Moçambique, e numa época em que a guerra estava longe do seu epílogo.

Em 1º plano  da esqª para a dirª, os Alferes Médicos Sá Couto,Celso Barbosa e Lourenco.
Em 2 º plano o Capitão Médico Requeijo e sua esposa
Estava colocado no hospital militar de Vila Cabral, o cirurgião Capitão Miliciano , Drº Requeijo, que em Portugal era chefe de cirurgia do hospital de Santo António, para onde Rui Vergueiro ia voluntariamente aprender as práticas de urgência. 
Foi a primeira pessoa a  reconhecer o Drº Requeijo logo no primeiro dia da sua chegada. 
Quando havia muitas evacuações, o Cap.Requeijo telefonava para o quartel a pedir uma ajuda. Foi ajudante de cirurgião ocasional e dador de sangue.
Segundo me lembro em finais de Setembro de 1974, recebi,como comandante das Transmissões,do Quartel General em Nampula para o Comando Militar do Sector "A" em Vila Cabral, o Tenente-Coronel Picciochi , ordem para ocupar o Posto de Rádio,da PIDE, e as estações dos CTT e da CHERET e para deter o  chefe local da PIDE.
Estas ocupações aconteceram na sequência de informações chegadas de que iriam ser utilizadas para comunicações contra revolucionárias provavelmente na esfera do que se passou a 7 de Setembro no Rádio Clube de Moçambique.  

O Cabo Cripto Eduardo Silva a receber do Ten.Cor, Picciochi, um prémio pelo seu trabalho literário 
O Tenente-coronel Picciochi, manteve-se à margem,tendo chegado a afirmar que, assim, não sabia ser militar. foi ele que recebeu  ordem para "deter" o Chefe local da PIDE/DGS. 
Os Majores Simões de Faria e Abrunhosa aderiram claramente ao espírito do 25 de Abril e já tinham conhecimento prévio do golpe militar.
Entre 27 e 29 de Abril estive em Nampula, onde participei numa reunião onde se exigiu uma clarificação da tomada de posição por parte das novas autoridades em Lisboa. Entre os participantes estava o meu amigo e companheiro das lutas académicas, Jorge Strech, julgo que pertencia como alferes à justiça militar.
Perante o impasse no pós revolução em que se encontrava Moçambique e a falta de directrizes da Metrópole, na reunião, onde esteve presente o major Mário Tomé, alguns mais inflamados sugeriram um golpe militar prendendo as chefias para quebrar a inércia e dinamizarem um processo revolucionário em Moçambique.
 Depois de muito tempo de espera por directrizes por parte de Nampula, o pessoal resolveu fazer uma "eleição" para representante local do MFA, na qual fui eleito. Esta eleição deveu-se à estratégia de criar ligações que garantissem uma nova dinâmica, de acordo com o espírito de ABRIL. 
Foi já nesta última qualidade,que por imperativo categórico, encetei as tentativas de contactar elementos da Frelimo, pois o Niassa foi o último Sector a fazer o cessar-fogo e Samora Machel havia determinado  que fosse feito um recrudescimento das acções militares.Com os acordos políticos assinados  entendi que não fazia sentido continuar a morrer gente e jovens a ficar estropiados.
Para chegar à Frelimo, contacte um Engº. agrónomo que se dizia sobrinho de Marcelino dos  Santos. Com ele só houve a 1ª saída e fizemo-lo no seu Volkswagen Carocha. Nessa viagem partiu-se e a viatura ficou imobilizada em pleno mato. Ao longe avistámos uma viatura que, mercê dos nossos sinais veio ao nosso encontro. Era um manchambeiro a que pedimos ajuda para avisar a guarnição militar de Unango, a nós e à viatura e se encarregaram de nos transportar até Vila Cabral.
Participei,amiudadas vezes à civil, e quase sempre desarmado e só, em vários encontros com responsáveis locais da Frelimo em locais como Cantina Dias, Unango, Nova Coimbra, Metangula, etc. Os nomes de alguns desses elementos dos guerrilheiros ficaram para sempre no limbo da memória que a passagem do tempo sempre acarreta, mas os encontros , as emoções vividas pela esperança da paz, essas não desapareceram.




Rui Vergueiro com os padres Camilo e Menegon, que pertenciam à Missão de Vila Cabral. 

O encontro foi no Bandece/Maniamba.Os dois civis, um era professor o outro foi o elo de 

ligação e intérprete que nos levou ao encontro com os guerrilheiros
A dada altura cheguei a entrar na base de Bandece/ Maniamba, onde me apontaram a mítica Kalashnikov à cabeça. Esta visita foi precedida da recepção duma missiva que me foi entregue na sequência de cartas que fiz seguir solicitando contactos e que foram veiculados pela Missão de Vila Cabral. Daí estarem os padres Camilo e Menegon, ambos Colombianos. Estava também presente um Professor (Mazuda ?) que serviu de contacto local.
Fomos no Land Rover da Missão até um ponto onde apanhámos um outro guia. Depois de cerca de meia hora a subir pelo monte, ouvimos o "enculatrar" de armas e fomos rodeados por guerrilheiros apontando-nos as Kalashnikov.
Houve um outro diálogo com o novo guia e ficámos à espera de ordem para avançar, com escolta até à presença das chefias. As minhas diligências foram cruciais para o abrandamento das actividades dos guerrilheiros, quer ao nível das emboscadas de itinerários, quer na colocação de minas nestes. Isto aconteceu por os responsáveis da Frelimo acreditarem na minha boa vontade, e na razoabilidade do MFA, que eu representava, querer uma negociação autentica.
Depois de tudo terminar assisti incrédulo ao comportamento dos políticos que na minha opinião não souberam salvaguardar os interesses de todos os residentes em Moçambique, das populações propriamente ditas e sobretudo daqueles que haviam combatido no exército português. Não tenho dúvidas que terão existido alguns fuzilamentos após a retirada completa do dispositivo militar português.
Quando preparava uma deslocação até à povoação de Cantina Dias a fim de ali tomar parte numa reunião preparatória com a Frelimo sobre a forma de materializar o cessar-fogo, recordo-me que ainda no comando em Vila Cabral cruzei-me ocasionalmente com o então capitão miliciano Cordeiro, comandante da 3ª do BCcaç 5011, que tratava naquele dia da burocracia para poder ir de férias.. O comandante da zona "A" ao ver o capitão ali, ordenou-lhe que me acompanhasse a Cantina Dias, que aliás ficava na jurisdição militar da sua companhia. Não muito satisfeito com a tarefa, o capitão lá partiu à civil comigo para o encontro aprazado. O encontro foi com o comandante Braga da Frelimo, que me pareceu um homem muito próximo do comandante provincial da época, Pedro Juma. Depois, e porque o jantar era pouco para os presentes, sentámos-nos à mesa com os guerrilheiros em sinal de amizade e franco convívio, mas optámos por não comer ali. Não foi ali que delineámos os traços gerais para um futuro cessar-fogo . Eles só queriam saber o que pensávamos e o que pretendíamos.Foi isso que escreveram exaustivamente.
 Para ajudar nas diligências pedi ao Bispo da igreja Anglicana,  Pina Cabral quer natural do Porto e na época estava em Lourenço Marques ou em Nampula. Contactei-o pela influencia que poderia ter para o meu objectivo.
 Mais tarde esteve aprazada nova reunião,esta a um nível já superior, em que estariam presentes altos dignatários da Frelimo em Nova Coimbra. Tudo foi combinado para os primeiros dias do mês de Setembro de 1974, altura em que delegações do governo provisório nacional e da direcção da Frelimo se encontravam em Lusaka a discutir os termos da passagem do poder.
Pela parte portuguesa deveriam estar presentes o major Simões Faria, responsável pelas operações militares no Sector"A", em representação do exército, o major Mesquita em representação da Força Aérea e o comandante da base naval de Metangula pela Marinha. A minha memória esbate-se neste ponto, mas julgo que terão sido estes os oficiais escolhidos para o encontro. Presente estaria igualmente o Tenente-Coronel Cyrne do Batalhão de Macaloge. Este oficial superior ofereceu-me, ainda na messe de oficiais de Vila Cabral, o seu pigalim que era símbolo de poder. Digamos que fui "condecorado" com o símbolo de poder de Comandante de Batalhão.


Rui Vergueiro e esposa, o alferes Mendes com bigode. Os dois últimos são o major Vieira Monteiro, com um dedo na cara, e um capitão. Ambos pertenciam ao BCAÇ 20 sediado em Vila Cabral
Saímos de Vila Cabral a bordo de um Cessna, com destino  à base de Metangula, e depois por via rodoviária até Nova Coimbra (MEVCHUMA). Ali foi preparada uma recepção excelente pelo capitão miliciano Salaviza, comandante da CArtª 7260 que estava no Lunho. No entanto os homens da Frelimo não apareceram e às 16h os militares portugueses optaram por almoçar sozinhos. Passados poucos minutos, chegaram emissários da Felimo,empunhando uma bandeira branca, que afirmaram que não tinha sido possível a comparência dos representantes esperados, mas no dia seguinte a reunião se poderia fazer na missão que ficava a meio caminho entre Nova Coimbra e Metangula (Missão Anglicana em Messumba) Assim ficou combinado, e no regresso a Metangula,resolvi pernoitar na missão, enquanto a totalidade dos outros oficiais recolheu à base naval em Metangula.
Era o dia 6 de Setembro de 1974. Na missão estivemos em amena cavaqueira com elementos do Conselho Provincial ali reunido quando por volta das 18h o rádio transístor que até aí transmitia música, interrompeu a emissão, anunciando a tomada do Rádio Clube de Moçambique em Lourenço Marques. Em altos berros o locutor anunciava que várias unidades, Comandos incluindo, tinham aderido ao movimento e que agora é que Moçambique ia ser livre. A Frelimo isto, aquilo etc... O Conselho Provincial retirou-se para reunir e eu fiquei a noite só, nada alegre mas sim bastante apreensivo
O Cap. Salavissa da CART. 7260, na Base Gungunhana, em confraternização com elementos da Frelimo
Passou-se a noite toda e foi pela manhã que surgiu na picada um jeep, transportando apenas um oficial. Tratava-se do major Simões de Faria, que saindo da sua posição de conforto, e questionado por mim. do porquê de correr tal risco, afirmou que na qualidade de oficial do quadro não aceitava o abandono à sua sorte de um oficial que lhe era subalterno e ainda por cima miliciano. Ali se estabeleceu para sempre uma amizade sólida entre nós dois.
O major era portador de uma mensagem interceptada, proveniente da Tanzânia, emitida por ordem de Samora Machel, em que eram dadas instruções claras para aprisionarem a Delegação portuguesa que estava presente na reunião.
Às 11 horas do dia 7, chegaram novos emissários da Frelimo que afirmaram estarem convencidos da justeza e autenticidade dos oficiais ali presentes, e portanto estes poderiam partir em paz, assim que desejassem.

segunda-feira, 13 de agosto de 2018

2004 - MOÇAMBIQUE REENCONTRADO POR UM COMBATENTE

O ENCONTRO DA ZAMBÉZIA

Extraído do livro de Manuel Pedro Dias, editado em 2004

38 ANOS DEPOIS, REENCONTRADO POR UM COMBATENTE

Há precisamente trinta e oito anos que, por imperativo do dever de cidadão, rumámos a Moçambique em cumprimento do serviço militar obrigatório.
Cerca de quatro décadas depois, encontrámo-nos, de novo, de novo, num outro cais de embarque para rumarmos a Moçambique e com destino aos mesmos locais que então nos foram atribuídos.
No aeroporto da Portela em Lisboa, contrariamente ao sucedido na Rocha do Conde de Óbidos, aquando do primeiro embarque, era notória a alegria estampada no rosto do "contingente ex-militar", prestes a embarcar para esta segunda "Comissão de Serviço".
Na sala de embarque não se vislumbravam lenços desfraldados ao vento, nem sequer rostos banhados em lágrimas, sentimentalmente violentados.
Aeroporto Internacional de Maputo. Momento em que pisámos solo moçambicano
DE MAPUTO A NAMPULA
Durante a permanência em Maputo o grupo foi recebido por representantes da Associação dos Combatentes da Liga da Luta Nacional , chefiados pelo seu Presidente, Dr. Gideon Ndobe. O encontro teve lugar na sede do Partido FRELIMO. Usaram da palavra o José Arruda, organizador da viagem, um representante da FRELIMO, o Presidente da ACLLN e dois companheiros de viagem, um deles, o Fernando Oliveira, que fez a oferta de alguns porta chaves com o emblema gravado do BCAÇ 1891. Presentes também alguns antigos combatentes da FRELIMO, entre eles uma senhora.
De Lourenço Marques o autor pouco se recorda, a não ser da Praça Mouzinho de Albuquerque e da sua área envolvente, nomeadamente o Café Continental, ponto obrigatório da passagem de todos os desfiles.
Falar de Moçambique e da sua antiga capital, Lourenço Marques, e não falar de Mouzinho de Albuquerque constituirá uma grave e imperdoável lacuna, O bravo capitão, herói de Chaimite.
Mas, a história não se compadece com os seus heróis. Por isso e por razões óbvias, Mouzinho e o seu cavalo foram apeados do seu pedestal e levados para um local que consideramos dignos e à altura daquele militar, a Fortaleza de Nossa Senhora da Conceição, actualmente transformada em Museu e Centro de Exposições.
Até ao princípio do século passado, mais precisamente 1907, Nampula não foi mais do que uma pequena povoação nativa que constituía a sede do Regulado que lhe deu o nome.
Por imperativos de ordem administrativa aquele comando, passou, posteriormente, à categoria de sede de circunscrição, denominada por Macuana, e nesta posição se manteve até 1935, para então constituir a capital da Província do Niassa, a qual, por força de uma organização administrativa, foi dividida em distritos, sendo designada Nampula como capital daquele a que seu o nome de Moçambique.
O topónimo desta cidade manteve-se mesmo depois da independência, apenas o Distrito sofreu alteração passando a designar-se Província de Nampula.
Neutel de Abreu, apeado. Os ventos da história ditam destas leis...
Após o eclodir do conflito armado em Moçambique (1964) e nos dez anos subsequentes,  podemos afirmar que Nampula se transformou, em termos logísticos, na "capital da guerra" no Norte de Moçambique, Ali afluíam pelas mais diversas razões, milhares de militares oriundos quer de uma grande parte da Zambézia, quer do Distrito do Niassa e de Cabo Delgado. Por outro lado, também naquela cidade se encontravam aquartelados centenas de militares nos mais diversos serviços do Exército e da Força Aérea.

AO ENCONTRO DA ZAMBÉZIA

Deixámos Nampula bem cedo levando na bagagem enorme ansiedade, já que iríamos dar início à verdadeira razão que nos levou a  Moçambique - visitar os antigos aquartelamentos por  onde andámos, nos anos de 1966 a 1968.A Zambézia encontrava-se ao nosso alcance, uma vez que se vislumbrava já o serpentear do rio Ligonha que divide esta província com a de Nampula.
Localidades onde estiveram as Companhias do BCAÇ 1891 na Zambézia
                                                     GILÉJá perfeitamente integrados na Zambézia, a caminho do nosso primeiro "aquartelamento" - o Gilé -, fizemos um breve paragem na antiga missão de Nossa Senhora da Anunciação, em Moneia. Finalmente, os companheiros de viagem mais directamente interessados na nossa primeira visita exclamavam com emoção <>. Chegados a esta localidade a primeira localidade foi apresentar as boas vindas ao Administrador, Este procedimento passou a ser uma constante em todas as outras visitas que efectuámos. Seguidamente, guiados por um companheiro de viagem, o Fernando Oliveira, que "habitou" em 1966 aquele quartel, visitámos as antigas instalações militares as quais, segundo os seus antigos moradores, se encontravam muito transformadas, algumas mesmo em ruínas. Contudo, algumas dependências do que foi o quartel Gilé, encontravam-se ainda de pé e habitadas, como por exemplo os quartos dos oficiais 
Aspecto parcial das antigas instalações do quartel do Gilé

                                     ALTO MOLÓCUÉ


Antes da partida foram distribuídas algumas lembranças pelas crianças. Este foi um acto um pouco conturbado já que a juventude, ao aperceber-se da situação, ocorreu em massa no sentido de tentar obter o desejado brinde.

Entretanto, dois companheiros de viagem, pertencentes ao BCAÇ 1891, que residiram no Alto Molócué, davam sinais de que o "objectivo" estava à vista dado estarmos a passar junto à Missão Católica, um ponto essencial de referência. Contudo,à entrada da Vila , aqueles companheiros desorientaram-se momentaneamente face à alteração fisionómica do local. Orientada a "bussola" tomámos o rumo certo visitando, em primeiro lugar, a zona onde se encontravam os antigos apartamentos e a messe dos oficiais, esta transformada, actualmente, em posto de polícia. Por se tratar de um departamento militar não nos foi permitido fotografar.
Quartel do Alto Molócué. A pinha em pedra era onde era hasteada a Bandeira nacional
Enquanto esperávamos autorização do Administrador local para visitar a vila, houve tempo, para. atentamente, observar a grande movimentação que por ali existia. O antigo palácio, residência do Administrador, mantém-se de pé, mas muito mal conservado.
Dado as antigas instalações militares se encontrarem dispersas ao longo da vila, dirigimo-nos seguidamente ao local onde, outrora, se instalavam, normalmente,os comandos das 13 Unidades que por ali passaram, de 1963 a 1974.
Paredes da Enfermaria e da Secretaria do quartel do Alto Molócué
Finalmente, encaminhámos-nos para o ponto alto daquela visita, essencialmente para os dois "Alto Molócuenses" Referimos-nos ao local onde se situava o quartel propriamente dito, uma velha e ampla fábrica adaptada para esse efeito. Encontrámos algumas daquelas instalações já sem cobertura, mas todas elas com as paredes laterais de pé, o que lhes conferia a traça inicial.

                      GURUÉ -(VILA JUNQUEIRO)

 Com cerca de catorze horas horas percorridos alcançámos, já as estrelas se tinham acendido no céu, a cidade do Gurué.
As duas viaturas estacionaram junto ao "Motel" Monte Verde.
Gurué em 2004. Avenida principal
Gurué 1968, Avenida principal vista de outro lado 
Face à longa jornada e ainda pelo facto de naquele dia não ter havido "lugar" a almoço, os nossos corpos reivindicavam, legitimamente, uma suculenta refeição e de igual modo um reconfortante banho, até porque alguns amigos de viagem mais pareciam ter chegado de uma daquelas colunas que se faziam, então, nas picadas do Niassa.
Aconteceu, porém , que os chuveiros "secaram", e tivemos por isso que recorrer, em alternativa, a um tradicional "banho" macua".
Após o jantar e parte do dia seguinte visitámos com alguma nostalgia, o que fora em tempos uma povoação que, em parceria com Milange, era considerada a Sintra da Zambézia.
O Gurué, primitivamente chamado NAMULIA, foi mais tarde rebaptizado de Vila Junqueiro, em homenagem ao homem que mais fez pelo chá naquela região. Após a independência voltou à anterior designação. Todavia, é bom realçar que há belezas naturais que o homem dificilmente consegue destruir. A paisagem envolvente do Gurué é uma delas.

                                             MOLUMBO

Montes NAMÚLI e plantação de
Manhã cedo, parte do grupo que fazíamos parte deslocou-se ao Molumbo para visitar esta localidade.
O percurso, outrora tantas vezes percorrido, foi saboreado quilómetro a quilómetro. A agitação no grupo aumentou de intensidade quando começámos a avistar, já de perto, o enorme morro sobranceiro à povoação de Molumbo.
Apresentada as "credenciais" à Administradora da localidade, que nos recebeu gentilmente,iniciámos a visita aos locais que a memória fielmente guardava. Quer nós, quer os outros quatro "molumbianos" identificámos-los todos um por um, sem hesitação. a  cantina civil, a loja do monhé, o campo de futebol e ainda, com as mesmas funções, o caminho tantas vezes percorrido do quartel à cantina, agora ladeado de imensas palhotas. Todavia foi a visita à velha prisão da Administração local, cedido ao Exército em 1966 para aquartelamento da primeira unidade militar, a CCAÇ 1559, que mereceu honras de visita mais demorada. Recordámos, com alguma emoção, os 17 meses que ali permanecemos.
Molumbo, a velha prisão convertida em quartel.
Do lado Dirrito ainda lá estavam as 5 Quinas.
Encontrámos aida duas figuras do nosso tempo, bastante idosas, mas muito lúcidas, com quem travámos diálogo. O Regedor e a Rosa, mulher do Ibraímo, esta sofrendo de cegueira quase total. 

Três horas depois do sonho concretizado regressámos ao Gurué para nos juntarmos ao resto do Grupo e prepararmos, após o almoço, a partida para Cuamba (Nova Freixo.

                     NA ROTA DO NIASSA 
A Azul estão as localidades onde estiveram as Companhias do BCAÇ 1891
CUAMBA (NOVA FREIXO)
Lioma, a caminho de Cuamba. Antiga câmara de desinsectização,
utilizada no combate  à mosca tsé-tsé
Abordávamos já terras do Niassa, rumo a Cuamba, quando o dourado arrebol, que nos tinha vindo a acompanhar desde há muitos quilómetros, se esbatia lá no fim da linha do horizonte, sobre os enormes vultos montanhosos de formas irregulares.

                                         MANDIMBA


Apesar das "injurias" do tempo, estas letras resistiram com tenacidade.
                                         MASSANGULO



Na foto: Missão de Massangulo. Escola Primária. A nossa presença provocou um alegre bulício nas crianças que, em atitudes frenéticas, todos queriam ficar na objectiva.

                                                   CATUR


Por aqui passarm milhares de soldados portugueses
A visita a esta esta localidade tinha para nós particular interesse dado que, noutros tempos, era um local muito emblemático porquanto ali desembarcavam, de comboio, praticamente todas as tropas que povoavam o Norte do Niassa. Nós por lá passámos também

                                                LIONE

O nosso objectivo de, dentro do possível, parar em todas  as localidades, pedimos ao "comandante da coluna" para efectuar no Lione uma paragem, curta que fosse.
Efectivamente, a paragem por, por razões de logística, foi breve.



Lione - No interior de onde outrora fora uma dependência militar, emerge uma frondosa árvore como que a proteger dos tórridossóis e das torrenciais chuvas as marcas ali deixadas por antigas unidades militares.
Numa das paredes deste edifício existem vestígios, que assinalamos, de antiga Unidade Militar. Qual será?
A alvorada em Lichinga, aconteceu bem cedo, pois a jornada antevia-se activa face às muitas visitas agendadas aos antigos aquartelamentos, localizados no  corredor de Metangula.
Previam-se também várias emoções por parte de alguns companheiros, aquando da passagem por certos lugares.
A primeira de uma delas, foi quando parámos junto ao rio Lualesi para prestar simbólica, mas sentida homenagem a três camaradas da CCAÇ 1560 que faleceram naquele local em 28 de Fevereiro de 1967, em consequência do accionamento de duas minas anti-carro quando ali se deslocaram para verificar a segurança da ponte.


Local onde a 27 de Fevereiro de 1967, se deu o acidente
O Fernando Oliveira, n imagem de camisa branca, foi um dos que, então, se deslocou ao local para prestar auxílio aos camaradas sinistrados.
Feita a homenagem, seguimos viagem até Maniamba.
Durante o percurso até Lhichinga levávamos também a intenção de visitar o quartel de Bandece. Infrutífera esta nossa tentativa, já que o mesmo, certamente, foi engolido pelas centenas de palhotas dispostas ao longo da estrada.

                                            MANIAMBA

Rodámos mais alguns quilómetros "escoltados" pela serra Jeci, por caminhos noutro tempo tão perigosos, até nos determos em Maniamba.
Ficámos deveras impressionados com o que vimos nesta localidade. A população aumentou assustadoramente, por toda a parte se viam crianças, adolescentes e adultos sem ocupação alguma. As crianças cercaram as viaturas de mãos esticadas para obterem não sei o quê.
Seguidamente, iniciámos a visita às antigas instalações militares, que se encontravam praticamente todas em ruínas, excepção feita aos monumentos deixados por antigas Companhias em homenagem aos seus mortos. Consideramos este o facto mais significativo da nossa visita, pois não imaginávamos que estes símbolos conseguissem perdurar ao longo de tantos anos. Eram visíveis, ainda, os nomes, inscritos na pedra, de alguns camaradas.,


Na foto em 1º plano o memorial da CCAÇ 1560. Ao fundo o da CART.2495
Emoldurados por dois seculares troncos de árvores e tendo como fundo a serra Jéci, estes dois padrões, resistido ao tempo, talvez também com a ajuda dos residentes de Maniamba, o que nos apraz registar, irmanam-se, chorando os mortos cujos nomes se mantêm gravados no seu "corpo".

São pela CCAÇ 1560:

Manuel Armando Oliveira Marques em 30-10-1966
Fernando Silva Fernandes em 28-2-1967
José Paiva Simões em 9-3-1967
Luís António Andrade Âmbar 25-6-1967

São pela CART. 2495

Soldado Guedes Ribeiro em 7-5-1960
1º Cabo Correia em 21-6-69
Soldado Rodrigues 21-6-69

Quando nos detínhamos junto do monumento erigido pela CCAÇ 1560, o Fernando Oliveira foi abordado por um residente que lhe disse estar a conhecê-lo, adiantando que  (apontando para um nome inscrito no pedestal) tinha sido mainato deste alferes, o alferes Âmbar. Acrescentou ainda que, de quando em quando, vai colher uma erva daninha que  cresce em redor do monumento.


Diálogo entre o Alberto, mainato do alferes Âmbar e o Oliveira da CCAÇ 1560
                                          METANGULA
O serpentear da picada transporta-nos ao que poderia ser um paraíso turístico
Quando de Maniamba iniciámos o percurso até Metangula, através de picada pouco conservada, levávamos a imagem, noutros tempos fixada na retina, do começo da grande encosta, onde forçosamente nos detínhamos, para abraçar o espectáculo grandioso da baía de Metangula. Se ali fôssemos colocados incognitamente, diríamos que estávamos perante um grande mar, tal a grandiosidade e a impressão e a impressão que se colhe daquela enorme massa de água, de que não se vê o fim, chamado LAGO NIASSA.
O nome Metangula provém, segundo se diz, de um clã habitou um lugar chamado Metangoni, o que parece identificar-se com Metangula.


Edifício do Comando.Quantas vezes nesta porta foi ouvido. Meu Comandante dá licença
Desde 1963 até à Independência, passou a chamar-se de Augusto Cardoso, mas este antropónimo não teve grande aceitação por parte da população.
Qual "Clic" mágico e aos solavancos da viatura provocados pelo mau estado da picada, reavivámos tudo o que atrás acabámos de descrever. Na nossa frente, imponente e majestoso. o Lago dava-nos as boas vindas.
Entre Nova Coimbra e Metangula o paraíso de CHUANGA, perto de Messumba

NOVA COIMBRA (MECHUMUA)
Os escassos quilómetros entre CHUANGA até ao local onde foi o antigo quartel de Nova Coimbra foram percorridos por caminhos conhecidos. As Missões de MESSUMBA (Anglicana) e de NOVA COIMBRA (Católica), esta, por razões evidentes, já com outro nome - MEVCHUMA - e o aldeamento, este densamente povoado. Um pouco mais à frente encontrámos um marco de estrada que nos provocou, ao lermos o nome nele inscrito, o impulso, dentro da viatura, de "bater uma chapa". Referimo-nos à povoação do LUNHO, "capital" do então "ESTADO DE MINAS GERAIS".
LUNHO: A "Capital do Estado de Minas Gerais" dista 30  Kms


Poucos metros mais à frente  presenciámos um "quadro" que não resistimos em narrar. À beira da picada, uma criança aparentando uns 7 anos e com atitude de um verdadeiro vendedor, perfilava-se junto a uma banca feita de paus, quase da sua altura, anunciando o produto que consistia em pequenos ratos de campo, ordenadamente alinhados "na montra do seu estabelecimento". Soubemos que há procura deste "bem de consumo".
Minutos depois chegámos ao local do antigo aquartelamento de Nova Coimbra, praticamente em ruínas. Apurámos que a sua destruição ficou a dever-se, em parte, a violentas batalhas ali travadas entre a Renamo e a Frelimo. Ironias do destino.





NOVA COIMBRA (MICHUMUA), tanta dor...tanto sofrimento
NOVA COIMBRA - não escondemos que foi com uma certa pontinha de emoção que colhemos estas imagens, onde a "mensagem de boas vindas" aos "Chekas" ainda bem marcante numa velha parede, ladeia com "esqueletos"  de velhas viaturas minadas, quem sabe se na então fatídica estrada NOVA COIMBRA/LUNHO.
                 
                         CHEKA TUDO ISTO É GUERRA

                                  CANTINA DIAS - NSANCA
Com as imagens dos destroços das berliets deixadas em NOVA COIMBRA gravadas na memória, e tendo ainda o sol como companhia, chegámos a CANTINA DIAS, actualmente chamada de NSANCA, que em dialecto local quer dizer "sofrimento", através de um percurso em muito bom estado de conservação.
De igual modo, encontrámos as antigas instalações militares que, segundo um professor a quem demos boleia, estão a ser recuperadas para pôr em prática um ambicioso projecto escolar.
A CANTINA DIAS a par de MANIAMBA, desfruta de bons acessos à capital da província, o que lhe confere potenciais recursos para um melhor desenvolvimento

                                               MEPONDA

Encontrámos MEPONDA, praticamente sem vestígios do passado, a não ser uma ou duas ruínas que não conseguimos identificar. Referimos-nos como se depreende, às antigas instalações militares.
MEPONDA, antigas instalações militares.
Além disso e não fugindo à regra, deparámos com a povoação superlotada de palhotas. Razão justificada, neste caso, face à sua privilegiada  localização junto das margens do LAGO NIASSA.
Quem visita esta povoação, uma das imagens que leva retida é, sem dúvida, o enorme imbondeiro , qual ex-libris de MEPONDA, situado junto à praia e onde noutros tempos, o seu enorme tronco serviu de Altar, hoje já desaparecido, a uma Imagem de Virgem Maria.

1967, a CCAÇ 1558 de passagem por MEPONDA
                               VILA CABRAL - LICHINGA
Por razões de metodologia, deixámos propositadamente para o final deste capítulo a cidade que tão cordialmente nos recebeu durante dois dias..
Porém, antes de nos debruçarmos sobre a nossa visita referimos, em breves e sintéticas notas, a forma como LICHINGA evolui desde que: 
Em 1932 a sede do distrito do Niassa é transferida de MANDIMBA pa ra VILA CABRAL (ainda com a designação de LICHINGA,) que simultâneamente passou a ser sede da circunscrição de METÓNIA, tendo dois anos depois sido extintos  o Distrito e Concelho e integrados na Província do Niassa, com sede em NAMPULA.
Em 1945 foi criado o Distrito de VILA CABRAL com sede na vila com o mesmo nome, mas no ano seguinte passou a designar-se Distrito do LAGO.
Em 1954 voltou à designação de Distrito do Niassa.
VILA CABRAL assim designada a partir de 1945 em homenagem ao antigo governador-geral JOSÉ CABRAL, foi elevado à categoria de cidade em 1962.
Após a independência de Moçambique retomou o nome de LICHINGA e continua a ser capital da PROVÍNCIA do NIASSA.
LICHINGA, de há una anos a esta parte, sofreu um elevadíssimo aumento demográfico. Para se ter uma ideia basta comparar os números de 1974, trinta mil habitantes, com os cento e vinte mil de 2004.
A região de LICHINGA, face à grande diversidade de climas, relevos e solos, dispõe de excelentes condições para incrementar um promissor e desejado progresso, que já se nota existir em determinados sectores.
A convite do José Arruda, organizador da viagem, tivemos no jantar do segundo dia a companhia do presidente do Município de LICHINGA que, após a refeição, proferiu um breve discurso onde salientou, com fluentes palavras, a amizade que une Portugal e Moçambique, tendo agradecido a nossa presença na sua cidade. Ao terminar disse que tinha muito gosto em nos receber, no dia seguinte, na sede do Município.
Recepção no Município. A discursar o Presidente, Cristiano Taimo
Após a simpática recepção , visitámos, acompanhados por um antigo oficial da FRELIMO, actualmente com a patente de brigadeiro, as antigas instalações militares que estão a ser devidamente recuperadas para serem transformadas no IFAPA ( Instituto de Formação de Administração Pública e Autárquica), e que irá ter capacidade para 300 alunos.

Cemitério de Vila Cabral (Lichinga), talhão dos combatentes portugueses 
Seguidamente  e acompanhados pelo referido oficial, dirigismo-nos ao cemitério, já desactivado, em romagem ao talhão onde se encontram sepultados antigos camaradas combatentes.
Ficámos sensibilizados pela forma como encontrámos aquele cemitério que, apesar de desactivado, não apresenta aspecto degradante.
Após as visitas mantivemos com o Brigadeiro Bernardo Moisés, que nos acompanhou, um interessante  e amistoso diálogo onde recordámos o nosso percurso, em campos opostos, durante a permanência no NIASSA em 1967.
A certo passo da nossa conversa, perguntou-nos aquele oficial quais os locais por onde tínhamos andado, ao que respondemos: CÓBUÉ, MIANDICA, NOVA COIMBRA, LUNHO e MANIAMBA.
Com um leve sorriso disse: Também lá andei nessa altura por essas paragens, uma vez que eu fui oficial nas bases do CATUR, LIPOCHE e outras instaladas no NIASSA.
Pedro Dias, autor do livro, com o Brigadeiro Bernardo Moisés
Quando a nossa viagem a Moçambique não passava de um mero sonho, idealizávamos quão emocionante deveria ser falar, em tempo de paz, com alguém com quem "convivemos" contrária e incognitamente, em período de guerra. Não nos enganámos, a emoção existiu mesmo.
Seguidamente, um pequeno grupo, como pretexto de tomar uma "bica" dirigiu-se até ao famoso Café Planalto para reviver o local que noutros tempos era ponto de encontro de todos os militares residentes, ou não, na então VILA CABRAL. Encontrámo-lo bem conservado.


LICHINGA Antigo Café Planalto, tem como sentinela uma frondosa árvore
Finalizamos esta nossa passagem pela capital do NIASSA, com uma referência à excelente unidade hoteleira inaugurada em Agosto de 2003 - o Hotel Girassol -, bem como à Pousada de Lichinga que, segundo nos disseram, foi recentemente remodelada..
LICHINGA, que em dialecto local, Segundo apurámos, quer dizer subida (subida para o planalto) encontra-se de facto com o "vector"  apontado para o futuro.


LICHINGA. Hotel Girassol. Funcionários municipais tratam do visual da cidade
POUSADA de LICHINGA


                                                    FIM









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