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Livros da guerra colonial

Miandica terra do outro mundo


sábado, 23 de agosto de 2025

PANFLETOS E CARTÕES DA FRELIMO

 3.2. Panfletos e cartões da FRELIMO 

Estes meios discursivos, geralmente, insinuavam ódio contra os portugueses, apelavam a população e aos soldados moçambicanos que lutavam ao lado do exército colonial português a apoiar e juntar-se a FRELIMO como a única saída para a independência de Moçambique, e exortavam a independência, como se pode ver nos panfletos seguintes: 

Estes panfletos, estavam geralmente  escritos em português, por vezes, em línguas locais e para o caso do Niassa foram usadas as línguas yao, nianja, macua, angoni e kiswaili.

 


  A título de exemplo, um panfleto escrito em Ciyao encontrado na povoação do regedor Namaluesso, no posto de Unango, no dia 31 de Julho de 1965, constante no Relatório sobre os incidentes no distrito do Niassa, continha os seguintes dizeres: “meus filhos, não tenhais medo dos portugueses e ficais sossegados. Não andeis muito pelo mato porque, se assim fizeres, sereis mortos pelos portugueses. Este discurso constituiu um apelo à população para que esta soubesse das suas acções e evitasse colidir com as minas que eles colocavam pela mata adentro. Através de panfletos, os guerrilheiros da FRELIMO, procuravam desencorajar os moçambicanos que se filiaram ao exército colonial e milicianos dos aldeamentos, combatendo contra os guerrilheiros, mostrando-lhes que se tratava de uma traição à pátria. Desencorajavam o exército português com textos que eram deixados ao meio das picadas, apelando para que estes voltassem a Portugal e alguns destes textos, pode-se ler: “ Hô soldado português, nos não queremos matar-te, não somos teus inimigos, tu é que es nosso inimigo! Tu estas a matar o nosso povo! Volta para tua terra soldado português. Se não voltares, os guerrilheiros da FRELIMO vão te matar. La na tua terra deixaste teu pai, tua mae, teu filho, tua mulher e nunca mais hádes voltaras a ve-los, has-de morrer aqui numa emboscada sem glória como morreram já centenas de companheiros teus. Soldado português, tu não lutas pela defesa da pátria. A tua pátria é Portugal, não é Moçambique. Tu defendes interesses de capitalistas. Eles vivem riquíssimos como grandes senhores em Lisboa e mandam-te a ti morreres no mato. Vais morrer a defender a riqueza dos capitalistas em Moçambique. Estas meios discursivos, por vezes, surtiam efeito, pois, alguns milicianos confiados na defesa dos aldeamentos chegaram a juntaram-se à FRELIMO levando consigo as suas armas. Outros, ainda, prestaram informações aos guerrilheiros sobre a organização e tipo de armamento da tropa colonial portuguesa nos seus aquartelamentos. Outro exemplo de impacto dos panfletos da FRELIMO no Niassa foi o caso de Cambambe, que, tendo sido antigo soldado português e mais tarde radicou-se, por muitos anos, na Tanganica (natural de Nhamaluesso, posto administrativo de Unango). Este foi visto na povoação de Nachango, grupo de Matenda, a vender cartões da FRELIMO (que se chamavam de Cuacha que significa amanhecer) ao preço unitário de 10$ escudos


conforme se pode ver adiante. Para evitar que estes factos se replicassem largamente no seio da tropa colonial passou a efectuar-se um trabalho de sensibilização de todos recrutas e, segundo narrativas de Amadeu Silva, ex-membro da tropa colonial no Niassa, ao descrever a sua ida a Moçambique disse: “éramos doutrinados em Lisboa, que estávamos a ir a África (Moçambique) para defender Portugal, que na prática não era bem assim”. Quem estava a violentar e precisava de se defender eram os moçambicanos. Para comprovar a sua narrativa, destapou que, ao chegar em Gurué na região na Zambézia, “deparei-me com indivíduos africanos sendo transportados em camiões como de animais se tratassem e eram forçados a trabalhar nas plantações de chá, geralmente violentados”. Mesmo com estas acções, visando contrariar a táctica empreendida pela FRELIMO, militantes e guerrilheiros do movimento, empenharam-se na mesma direcção propagandística em diferentes momentos e usando todos meios possíveis conforme se pode confirmar na informação seguinte.


Apoios a FRELIMO 

Dada a acção eufórica da tropa colonial, a FRELIMO procurou apelar à consciência da população, às ideias de paz e de justiça, dirigindo a sua acção a grupos-alvos seleccionados como: trabalhadores, estudantes, sobretudo das missões, militares e mulheres, apresentando como ideias chave a guerra injusta, o direito a independência e a autodeterminação, o atraso económico provocado pelas despesas da guerra e os sacrifícios exigidos a juventude e a suas famílias. Por vezes, foram usados discursos intimidatórios como foi feito ao Regulo Majolela de Sanga, que chegou a ordenar a fuga da sua população para o mato por ter sido instigado por um elemento da FRELIMO que de passagem pela sua aldeia ameaçou a população dizendo: “se não fugissem iria buscar leão, abelha e cobras para fazer mal a população. Pela crença na superstição, a população abandonou a aldeia. 

3.3. A Propaganda, Mobilização e recrutamento de guerrilheiros 

A actividade de mobilização e propaganda foi desenvolvida imediatamente após a fundação da FRELIMO, em 1962. As acções de mobilização visavam inicialmente o recrutamento de militantes para engrossar as suas fileiras, distribuição ou venda de cartões e recrutamento de jovens para irem receber treinamento militar no exterior. Todas estas acções tinham como objectivo último a criação de condições para a guerra. Com este trabalho de base, a FRELIMO conseguiu estabelecer estruturas a nível dos distritos como núcleos clandestinos, células e comités no interior de Moçambique. A montagem destas estruturas a nível das comunidades, implicava uma aceitação e consideração, com isso, entende-se que a autoridade da FRELIMO no Niassa começa a forma-se quando os seus emissários começam a chegar as comunidades. Nesta altura, algumas comunidades imediatamente aderiram a causa fornecendo homens para engrossar as suas fileiras, dinheiro e viveras. A FRELIMO engajou-se no envio de jovens para estudarem no exterior através de bolsas de estudo. Com ajuda de parceiros estrangeiros, a FRELIMO estabeleceu a sua primeira escola secundária na Tanzânia. Todo este esforço demonstrava a importância que a FRELIMO dava para a educação e formação dos futuros líderes do Moçambique independente. Para a FRELIMO, a mobilização e propaganda constituiu um dos principais pilares de afirmação discursiva no seio das comunidades em Niassa. Inicialmente, este sector (Mobilização e Propaganda), foi dirigido por Osvaldo Tazama. O processo de mobilização política foi realizado de forma clandestina através de reuniões secretas em grupos ou de forma individual. Mesmo assim, a PIDE foi capaz de deter muitas pessoas consideradas suspeitas de envolvimento nestas acções. As Campanhas de mobilização estavam a cargo do Departamento de Organização do Interior. A actividade de mobilização levadas a cabo pelos primeiros elementos da FRELIMO a chegarem a região do Lago Niassa consistiu em contactar as autoridades locais, neste caso, foram os Régulos Lipoche, Chiteji e Massanche que foram receptivos ao estabelecimento de Namate e Polomola, concretamente em Chigoma, onde criaram as bases para a difusão dos ideais independentistas ao longo do litoral do Lago Niassa e fronteira com a Tanzânia, o que facilitaria a comunicação com os dirigentes da FRELIMO, consistiu também na realização de Banjas, venda de cartões do Movimento e a outros. Foi com base em diferentes estratégias que a FRELIMO mobilizou milhares de jovens das aldeias rurais para participarem como soldados na sua campanha político-militar. Nos diferentes grupos, centenas de meninas também foram integradas nas fileiras dos soldados guerrilheiros. Recebendo o mesmo treinamento militar que seus camaradas, as recrutas trabalhavam principalmente no transporte de material de guerra e nos hospitais e creches da FRELIMO. 

O Furriel Amadeu a confraternizar com habitantes de Messumba em Agosto de  1967

Em graus variados, “elas travaram combate directo com soldados homens. Uma outra forma propagandística de apelo à consciência levada a cabo pelos elementos clandestinos da FRELIMO, no Niassa sobretudo, à população que se encontrava concentrada em determinadas povoações, foi o discurso no qual faziam constar que os portugueses apelavam às pessoas para se concentrarem em determinadas povoações com o fim de lhes ser mais fácil. Este Departamento realizava campanhas de informação sob comando do Departamento de Informação e Propaganda que editava revistas e boletins como o ‘A voz a Revolução’, o ‘25 de Setembro’, ‘A luta continua’, ‘os heróicos’, o ‘3 de Fevereiro’, entre outros. Para além disso, ao nível da rádio emitia-se a ‘Voz da Frelimo. Por outro lado, sob comando do Departamento das Relações Exteriores realizaram-se campanhas de informação e propaganda no exterior para angariar apoios para a FRELIMO e motivar condenações a Portugal. Este discurso precipitou o abandono dos aldeamentos, incluindo parte da população residente na Vila Cabral, e a ida para as matas, onde a FRELIMO acolhia as pessoas nas suas zonas libertadas. Sob a forma de reportagem escrita e fotografias, a FRELIMO foi desenvolvendo a sua propaganda em diferentes vertentes e sempre que houvesse oportunidades, tendo até infiltrado no interior do Niassa elementos para registar e posteriormente espalhar as reportagens escritas, fotografar e filmar diferentes eventos da guerrilha e a forma como vivia a população. Esta prática foi continuada e difundida em órgãos de informação nacional e internacional, o que, de certa forma, ajudou a FRELIMO a solidificar a sua autoridade e a obter inúmeros apoios que foram chegando de diferentes quadrantes, conforme se pode ver adiante. A propaganda assentava na necessidade de lutar pela independência contra os abusos de poder e a exploração colonial, acabar com as antigas relações sociais, criar um poder novo, superior e mais progressivo que o antigo. Desenvolvia-se o discurso que levasse a crer que somente através da revolução se podia construir um Moçambique independente, livre e democrático, onde os cidadãos pudessem viver com dignidade, decência e segurança. A propaganda constituiu um dos meios, se não o mais usado pela FRELIMO, para cimentar a sua autoridade no Niassa. Ela não se limitou apenas ao distrito de Niassa, foi replicado na diáspora como foi o caso do Malawi onde foram distribuídos cartões da FRELIMO, concretamente na cidade de Limbe pelo moçambicano residente, Alberto Manhiça, natural de Lourenço Marques na vila de Manhiça. Na diáspora, era necessário mostrar à comunidade internacional que a FRELIMO era o legítimo representante do povo e que tinha uma autoridade formada. A acção propagandística também foi levada a cabo através de discursos dirigidos a grupos de indivíduos, como foi o caso da acção de Aquido Buana e Aquido Selemane em 1965, ambos naturais da povoação de Lulanga, que convidaram um grupo de jovens a se engajarem na FRELIMO dizendo que “Moçambique pertence aos africanos e para que todos ficassem a viver bem, tornava-se necessário fazer guerra contra os brancos portugueses, no sentido de expulsar desta província, que só aos pretos pertencia, pois efectivada tal expulsão e de uma vez, Moçambique independente, todos os africanos viveriam bem. De seguida, os mesmos deram exemplo dos países vizinhos que se encontravam independentes cujos governantes já tinham proporcionado a população melhor nível de vida. Em diferentes Banjas, realizadas pelos guerrilheiros da FRELIMO com as populações, de forma clandestina cujas actas podem ser encontrados em diferentes relatórios dos administradores coloniais - foi usado o discurso segundo o qual os impostos que estes (a população) pagavam não lhes davam nenhum benefício, antes pelo contrário, com aquele dinheiro, o governo português comprava aviões, carros e armas de guerra que estavam a ser usados para os matar. Para aliciar os presentes, diziam que o quantitativo dos impostos deveria, sim, ser empregue na construção de hospitais, escolas, estradas e outras infra-estruturas, e diziam ainda: “como sabeis, os portugueses até agora nada fizeram por nós. Como podemos constatar, a propaganda da FRELIMO foi feita com intensão de chamar a consciência da população para a necessidade de alcançar a independência que era negada pelas autoridades coloniais, ela foi materializada com uso de panfletos e consolidada com a distribuição de cartões do movimento às populações. Os panfletos eram geralmente usados para passar informações mais estruturadas e para um grupo de pessoas especificas, destacando-se professores, funcionários da administração colonial, catequistas e incluindo a tropa colonial portuguesa e de mais colaboradores desta. Apesar da intensificação da exploração colonial em benefício do capital português, repressão violenta, prisão e negação sistemática do exercício de direitos políticos para a maioria do povo moçambicano, a população do Niassa, aos poucos, foi tomando conhecimento da existência da FRELIMO e foi tendo um crescimento político clandestino activo, inspirado no ambiente político internacional. Os dirigentes da FRELIMO, na sua maioria originários da pequena burguesia (intelectuais e empregados) ou dos meios dos trabalhadores das cidades (motoristas, enfermeiros, professores e outros) procuraram viver o quotidiano da população. Partilharam as suas vivências, com as diversas camadas camponesas, junto das populações rurais, acabaram por compreender melhor o povo, descobrindo assim os seus valores culturais (artísticos, filosóficos, políticos e morais) o que 114 de certa forma os permitiu transmitir os ideais nacionalistas e edificar neste meio a sua autoridade. Nestes contactos, as massas trabalhadoras, principalmente os da missão de Messumba, os camponeses geralmente sem formação académica e que nunca tinham ultrapassado os limites da aldeia ou da povoação ou da região, passaram a ter contacto com outras categorias; os complexos que os limitavam nas relações com outros grupos étnicos e sociais, passando a compreender que eram elementos determinantes na luta; quebraram a dimensão da aldeia para se integrarem progressivamente no país e no mundo. Passaram a adquirir uma infinidade de conhecimentos úteis para a sua actividade imediata e futura no âmbito da luta, reforçaram a consciência política assimilando os princípios da revolução nacional e social postulada na luta, tornando-se mais aptos para desempenhar o papel decisivo de força principal do movimento de libertação, referem-se à adesão da população à FRELIMO na região do Lago Niassa como uma acção que foi facilitada pelo alargamento da base de pessoas instruídas, fruto da acção das escolas Missionárias Anglicanas na região, pois estas contribuiram para a criação de um ambiente receptível ao movimento nacionalista bem como o desencadeamento das acções concretas contra a dominação colonial portuguesa e que contou com o envolvimento massivo e activo dos professores da Missão São Bartolomeu de Messumba. Os mesmos, constatam a existência de núcleos clandestinos em Messumba que tinham o objectivo de incrementar a disseminação de informação e mobilização da população para a causa da luta, recepção de mensagens e material propagandístico da FRELIMO vindas de Tanzânia e transmitir as comunidades. A presença dos guerrilheiros da FRELIMO no Niassa não foi uma acção tao fácil. A titulo de exemplo, foi o caso do que aconteceu na região sul do distrito, junto ao Lago Amaramba (Mecanhelas) e um pouco ao redor da então Nova Freixo (Cuamba), pelo facto de a população.  


Uma espécie de elo de ligação entre a população e os nacionalistas moçambicanos – realizavam contactos interpessoais sob alegação de estar a realizar visita familiar ou social de formas a evitar suspeitas das autoridades colónias portuguesas. Os pioneiros e exercerem está tarefa na região foram Sidney Namate e Orlando Polomola, enviados pela direcção da FRELIMO de Dar-es-Salaam local, por orientação da autoridade tradicional (Regulo Mecanhelas), ter-se oposto e resistido a qualquer infiltração dos primeiros agentes da FRELIMO, tendo pegado alguns que os abordava e encaminhado as autoridades coloniais que deram conta de todos outros que que por ali entraram. Mesmo assim, com controlo serrado de todas as forças mobilizadas ao terreno, (tropa terrestres, fuzileiros fixados ao longo do Lago, esquadrilhas de aviões, por militares, por administrativos, por brigadas da polícia internacional da segurança pública e segurança fiscal), os agentes da FRELIMO, souberam encontrar estratégias adequadas de penetração nestas e outras regiões do vasto Niassa com adversidades ligadas ao fraco povoamento como falta de abrigo, alimentação e outras. O trabalho de mobilização e recrutamento de jovens foi materializado de forma clandestina e o mesmo precedeu o lançamento da luta armada e foi continuado no decurso da guerra, associado ao processo de formação da autoridade política da FRELIMO. Em determinadas circunstâncias o recrutamento de guerrilheiros, foi feito com recurso a métodos coercivos e, a título de exemplo, foram os recrutamentos na área de “cantina Dias em que João Mário, proprietário de uma loja que recusou violentamente a solicitação dos elementos da FRELIMO, reuniu sua família e avisou-lhes para não acreditarem nas suas palavras e não lhes dar auxílio nenhum”. Na mesma noite, João Mário foi raptado, amarrado, levado ao acampamento da FRELIMO, interrogado e torturado. Escapou porque houve um ataque das tropas coloniais em que os elementos da FRELIMO saíram em debandada e foi feito prisioneiro e contou o que lhe acontecera. Para além deste facto, em 1965, os guerrilheiros da FRELIMO entraram pela fronteira em Mandimba até a povoação de Chala, encurralaram a população em suas palhotas e recrutaram jovens que consideraram adequados para engrossar as suas fileiras. O recrutamento e a mobilização eram geralmente feitos na calada da noite mediante entrega de cartões do movimento e, segundo se descreve no Relatório dos incidentes ocorridos no distrito do Niassa, os guerrilheiros ou militantes da FRELIMO batiam às portas das casas dos residentes das aldeias e quando abrisse a porta diziam: “viemos convidar-te para pertenceres ao nosso grupo de Tanganica, o grupo da FRELIMO que quer fazer guerra ao branco”. Diante deste discurso, existiram muitos que aceitavam e partiam de imediato para se juntar ao movimento, outros recusavam alegando estarem a viver em paz, que não eram inimigos dos brancos e não queriam ter segredos. 116 Diante destes discursos, aparentemente intimidatórios, outros elementos das comunidades temendo a sua integridade e da sua família, sentiam-se aflitos e pressionados a aderir ao movimento e assim o fizeram. O aliciamento das comunidades também constituiu uma estratégia para recrutar jovens para as fileiras dos guerrilheiros da FRELIMO. Uma das evidências consta nos relatórios coloniais em que são frequentes narrativas de aliciamentos feitos por elementos ligados a FRELIMO, como foi o caso do filho do Regedor Miandica, de nome Lumbandar, que disse aos seus amigos que já era cipaio da FRELIMO, onde se ganha muito dinheiro – umas 15 libras por mês – e não se passava fome porque toda a gente da povoação de Tulo, próximo de Miandica, lhes fornecia toda comida necessária. Num outro informe da PIDE sobre as actividades da FRELIMO, citando uma fonte supostamente segura, refere-se que o recrutamento de elementos para a FRELIMO era feito com promessas falsas de bolsas de estudo para América, Rússia, Egipto, Gana ou Argélia. No caso, cita-se o exemplo do que acontecera com o grupo de 9 indivíduos que, a 14 de Junho de 1963 partiu de Niassa a Blantyre e daí para Dar-es-Salaam e que depois seguiram para Marrocos no campo militar de Marnia onde permaneceram 9 meses de instrução militar. Portanto, foram várias as estratégias adaptadas pelos guerrilheiros da FRELIMO para garantir o engrandecimento das suas fileiras a fim de fazer frente a equipada e organizada tropa colonial portuguesa no Niassa, destacando-se o aliciamento, o convite de forma passiva e o recurso a coerção.

3.4. A educação política dos guerrilheiros O conceito de educação não é definido numa única perspectiva, mas sim em várias, dependendo sobretudo da base psicológica de apoio ou do tipo de aprendizagem, pode ainda ser definido em sentido amplo e estrito. De acordo com VIANNA (2008, p18), a “educação, em sentido amplo, representa tudo aquilo que pode ser feito para desenvolver o ser humano e, no sentido estrito, representa a instrução e o desenvolvimento de competências e habilidades”. Ou por outra, o sentido amplo refere-se à educação ao longo da vida do ser humano, enquanto, o sentido estrito corresponde às acções educativas que ocorrem na sala de aulas entre o professor e o aluno. É nesta segunda perspectiva que a FRELIMO procurou formar os seus guerrilheiros, na convicção de que, após a vitória, deveriam tomar as rédeas do desenvolvimento de Moçambique. No entender do antigo ministro da Cultura, Miguel Mkaima, “a educação desempenhou um papel determinante no desenvolvimento da consciência libertadora na população, facto que contribuiu para a independência do país”. Com este discurso, fica claro que a educação no processo de luta pela liberdade do povo moçambicano foi elemento fundamental por permitir que o povo tomasse consciência da liberdade e de pertença a uma pátria. De facto, a aposta na educação ajudou os moçambicanos na luta pela emancipação porque, na opinião das lideranças, não bastava treinar pessoas, era também preciso trabalhar as suas consciências para que tivessem noção de pertença, de pátria e de identidade como um povo uno. A FRELIMO insistiu na importância e necessidade de ter formação dos seus guerrilheiros e não só, para facilitar o avanço da própria luta. Foi assim que, para Eduardo Mondlane a educação era uma condição político-ideológica básica para o sucesso da luta, pois o problema do treino não envolvia apenas a componente físico-militar, mas também a formação integral do homem. Com esta perspectiva, no interior onde foram criadas as zonas semilibertas e libertadas, a FRELIMO preocupou-se em criar escolas e centros de ensino. A formação integral do homem compreendia três eixos da revolução, ao lado da produção e combate, orientados pela palavra de ordem: estudar, produzir e combater. É assim que a educação não era apenas uma tarefa exclusiva dos professores, mas sim de toda a sociedade, incluindo os próprios guerrilheiros”.  Em seu discurso, Mkaima, referiu que a ideia de apostar na educação como elemento crucial para o desenvolvimento das consciências não morreu com Mondlane, sendo que os dirigentes que se seguiram, deram a mesma importância a educação. De tal forma que, “a incomensurável importância da educação inspirou Samora Machel a compreender que a acção armada que se apresentou como a única alternativa para a conquista da independência nacional só lograria sucesso ao “fazer da escola uma base para o povo tomar o poder. É assim que criou a necessidade de ter gente com qualificações técnicas e um certo nível de educação básica para o domínio da luta em todas frentes”. Discurso na cerimónia de abertura das festividades dos 50 anos das escolas da FRELIMO, in Jornal O PAIS, de 17/09/2020. MACHEL, refere que as escolas ou centros de ensino existentes nas zonas libertadas, constituíam locais que iriam eliminar os complexos de superioridade dominante em alguns e que exprimiam o peso da mentalidade velha ainda presente. As escolas ou centros, tinham a tarefa de criar uma mentalidade nova e de um novo tipo de relações sociais em que a unidade era a palavra de ordem pois ela constrói e consolida a sociedade. Os alunos neste processo de educação política eram tidos como militantes da mesma causa.






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