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Livros da guerra colonial

Miandica terra do outro mundo


segunda-feira, 13 de maio de 2024

2ª PARTE (8º CAPÍTULO) DO LIVRO: O FIM DA LUTA DE LIBERTAÇÃO NACIONAL EM MOÇAMBIQUE. "OPERAÇÃO OMAR" 1 DE AGOSTO DE 1974 . LIVRO DE ATANÁSIO SALVADOR TUMUKE

 8.6. Acordos Lusaka e os Partidos Oportunistas

Depois das várias diligências à busca de consenso a criação de um governo de transição e fixação da data de independência de Moçambique, as negociações de Lusaka marcaram o compromisso político entre os beligerantes, Decorridas de 5 a 7 de Setembro de 1974, as conversações removeram o maior obstáculo que ainda separava as duas partes, nomeadamente, a representatividade da FRELIMO, relativamente a todo povo moçambicano. Mas porque razões este assunto foi arrastado por muito tempo? As causas reais configuravam-se nas manobras de Spínola apoiado, entre tantos cabecilhas pró- coloniais , por Jorge Jardim, os quais procuravam, a todo o custo transformar Moçambique em neo-colónia portuguesa.

Entre os factores por detrás deta ronda negocial , merecem destaque, a coesão, a robustez e a clarividência da FRELIMO, adjectivos enriquecidos pela relevância da "Operação Omar), como foi dito, um feito da própria FRELIMO. As exigências coloniais à alegada representatividade da FRELIMO podem ser entendidas, entre outras formas, da análise da situação política desenhada para Moçambique, na década de 1970.

A este respeito destacam-se três forças políticas , nomeadamente "Os Duros do Regime";          "Os  Autonomistas" e os "Oposicionistas". A sua característica principal, no caso dos primeiros, reside, como o próprio nome sugere, no endurecimento de posições colonialistas, não vergando perante ideias contrárias. A sua expressão mais visível era o Partido Acção Nacional Popular (ANP), antes União Nacional. O segundo grupo, resume-se nos proponentes das ideias de criação de uma DUI, encabeçado por Jorge Jardim, e o último, na defesa do federalismo, em que a FRELIMO estaria incluída. Esta última facção incluía alguns"nacionalistas inconfessos" que, inclusive,procuravam relacionamento são, com a FRELIMO. De entre os três grupos, o que me pareceu com maior protagonismo foi o dos Autonomistas, pois, como vimos, sob a liderança de JJ. como era tratado Jorge Jardim, já tinha criado fortes alicerces político e militares em Moçambique. Gozando desta reputação JJ procurou influenciar várias pessoas a criar uma corrente de pensamento independentista, ao seu estilo. Esta foi, na minha opinião, uma das armadilhas ideológicas com que a FRELIMO deparou em Lusaka,. Ao exigir representatividade, os seus mentores contavam com partidos que gravitavam em torno do ideário reaccionário,os quais, na hora da eventual aprovação do Referendo, iriam dar a cara, alegando ter legitimidade eleitoral, para concorrer ao lado da FRELIMO. São de se recordar as dúvidas do brigadeiro Hashim Mbita, já mencionadas. Estes partidos não passavam de verdadeiros oportunistas que, à semelhança dos abutres, não caçam, mas, procuram partilhar a caça efectuada por outros animais.

Aqui residem os fundamentos do Referendo, visando a criação do neocolonialismo no nosso país. De entre a série de movimentos"fabricados" ou incentivados pelo sistema colonial fascista, figuram o Gumo (antes FRECOM), liderado por Joana Simeão; Movimento Nacional Unificado de Moçambique (MONAUMO), chefiado por Domingos Cardoso; Movimento Moderado de Moçambique (MMM), de Hermínio Serra; Partido Democrático Afro-Lusitano, de Miguel Dantas; Partido de Coligação Nacional (PCN) de Uria Simango; Frente Independente de Convergência Nacional ou Frente Integracionista de Continuidade Ocidental, de Pires Moreira.Este cenário político em Moçambique orgulhava os seus mentores, pois  neles viam robustecidos os seus argumentos em torno do Referendo.                                                  Envaidecido, um dos pilares do processo do neocolonialismo português para Moçambique, o General Costa Gomes, é citado como autor do seguinte palavreado, em Maio de 1974.

A FRELIMO, como qualquer partido emancipalista, pode estabelecer-se em Moçambique, desde que cesse com a guerrilha. É evidente que enquanto não cessar com as operações guerrilheiras, não podemos aceitá-la como partido.

Joana Simeão

Joana Simeão foi recebida em Lisboa, a 3 de Agosto de 1974, pelo Presidente Português General António de Spínola, numa altura politicamente conturbada. Passavam dois dias do ataque ao Quartel de Omar e, na véspera (2 de Agosto), tinha havido uma ronda negocial entre Portugal e a FRELIMO, terminada sob um forte clima de tensão. Neste contexto, não coloco de lado a possibilidade deste encontro ter estado inserido nas "costuras políticas" em que estas duas figuras vinham mergulhadas, para contrariar a independência de Moçambique, sob a batuta da FRELIMO.

É de realçar que no dia 3 de Agosto, Spínola recebia o Secretário-Geral das Nações Unidas Kurt Waldheim, a quem terá manifestado a sua hipocrisia. No aeroporto de Lisboa Kurt Waldheim recebeu saudações de boas vindas de Mário Soares, Ministro dos Negócios Estrangeiros. Este dirigente destacou o processo de descolonização em curso no seu país, catapultado pelo Golpe de 25 de Abril e, numa espécie de confissão, referiu que o seu governo estava pronto a recuar dezenas de anos para o cumprimento das recomendações da ONU. Sobre este assunto, disse o seguinte:

Como Vxº sabe houve uma viagem histórica na nossa política colonial, referindo-se à Lei 7/74 de 27 de Julho, que nos comprometeu solenemente no processo de descolonização. Agora estamos dispostos a coordenar realmente com a ONU e a chegar com o seu conselho a concretização deste processo. Faço votos para que a sua visita seja uma visita histórica.

Em retribuição às palavras de Soares, o Secretário Geral das Nações Unidas, depois de agradecer o convite endereçado pelas autoridades portuguesas, destacou três aspectos importantes, nomeadamente:                                                                                                                                            1) o regresso ao regime democrático no país;                                                                                         2) a questão da descolonização;                                                                                                                3) a predisposição pessoal e das nações Unidas para o saneamento das dificuldades que surgiram no processo-                                                                                                                                              Eis o excerto da sua intervenção:

Estou verdadeiramente feliz por estar em Portugal e, depois aproveitar esta oportunidade para expressar a V.Exª e ao seu governo a minha gratidão pelo seu amável convite que permite a minha visita oficial a Portugal. Grandes mudanças estão em curso neste País e estou confiante que elas ajudarão V.Exª, o Governo eo povo a resolver muitos dos vossos problenas. Desejo fazer especial referência às importantes recentes declarações do Presidente Spínola , que estou certo irão contribuir para solucionar muitos problemas, especialmente os respeitantes aos Territórios de África. Pode ter a certeza, senhor ministro, que as Nações Unidas e eu, faremos todo o possivel que esteja ao nosso alcance para ajudar a resolver este problema.

Nesse dia, o General António de Spínola ofereceu um almoço ao Secretário-Geral da ONU. A respeito da hipocrisia manifesta neste encontro e, à luz das suas intervenções anteriores, é de  se conjecturar que  o Presidente Spínola tenha camuflado as suas reais intenções neocolonialistas, particularmente em relação a Moçambique, em forte e íntima colaboração com Jorge Jardim. Com efeito, Spínola havia aceite integrar a Comissão do MFA, aliás, sem que partilhasse inteitamente das suas ideias progressivas, democráticas e anticoloniais, tendo inclusive, caluniado a esta Comissão. Chegou a atacar os democratas do MFA, apelidando-os de comunistas disfarçados, agido em coligação com os marxistas da FRELIMO, MPLA e PAIGC.

Para compreendermos como a FRELIMO conseguiu contornar esta série de obstáculos, vale a pena socorrermos-nos do pensamento do grande nacionalista africano, Amílcar Cabral, a respeito dos factores que facilitam a penetração do neocolonialismo em África. Citado por Julião Sousa, Cabral destaca cinco elementos:                                                                                                              1) as divisões reinantes no continente                                                                                                      2) as razões históricas, em alusão à natureza do imperialismo;                                                            3) a debilidade dos próprios países africanos;                                                                                        4) a ambição e o oportunismo de certos dirigentes;                                                                               5) a ausência de estudos cientificamente fundamentados sobre a realidade de cada país e continente.

À altura das negociações, a FRELIMO preenchia os "requisitos" exigidos por Amílcar Cabral, com maior ênfase para a coesão, robustez e a clarividência. Foi com base nesses pressupostos que a FRELIMO recusou-se redundamente a aceitar a proposta do Referendo, pois sabia claramente a armadilha que este inseria. Associado a estes elementos a FRELIMO tinha nas suas mãos, 137  soldados prisioneiros do assalto ao Quartel de Omar. Representavam, sem sombra de dúvidas, como se veria, um baralho de cartas que  poderia jogar a qualquer momento, para arrancar a vitória neste jogo do Referendo. Foi assim que desapareceram muitos paridos oportunistas.

General Spínola, Presidente da República Portuguesa em 1974

8.7. Ameaças do Reacender da Guerra

Protestando contra as negociações de Lusaka, assistiu-se a violentos tumultos na cidade de Loureço Marques, tendo sido protagonista o Movimento de Livre de Moçambique (MLM). De igual modo, registaram-se ameaças de guerra, nos preparativos das cerimónias de celebração de independência Nacional, protagonizadas por Jorge Jardim. A maturidade política e a prontidão combativa da FRELIMO foram, mais uma vez,  fundamentais para se evitar a retomada da guerra, face a estes acontecimentos.

Lusaka, 7 de Setembro de 1974. Machel a acusar o Coronel Nuno Lousada de traição.

8.7. 1. Acção do Movimento Livre de Moçambique

No dia 6 de Setembro de 1974, eu estava em mais uma missão de busca do cessar-fogo local, em Montepuez. Essencialmente, esta missão tinha como objectivo transmitir aos guerrilheiros a necessidade de se parar com os ataques aos quartéis coloniais, bem como as emboscadas. Para  o efeito, entrámos em contacto com Manuel Chitupila, que entretanto nos tinha emboscado, porém desactivou a emboscada quando se apercebeu que éramos nós, pois estávamos trajados a pingo de chuva.

A missão era constituída por mim, Salésio  Nalyambipano (Chefe), Domingos Fondo, João Vinbambudi (Secretário), Cesário Nantimbo operador de Rádio (R-530 M). Estávamos hospedados no Palácio do Administrador local, António Pissara. Na madrugada do dia 8 tomámos conhecimento da rebelião que estava a acontecer na cidade de Lourenço Marques, protagonizada pelo Movimento Livre de Moçambique (MLM).                                                            Eram facções não representadas nos Acordos de Lusaka que, tendo ocupado a Rádio Clube de Moçambique e usando microfones, opunham-se à Independência Nacional. Soubemos que este acontecimento teria levado o Presidente Samora Machel a questionar ao Presidente de Portugal, General Spínola, se a guerra tinha ou não terminado. Em resposta, Spínola teria respondido positivamente, mas que ia provar isso pouco tempo depois. Com efeito, de modo a conter a rebelião, Spínola ordenou ao Comando da Região Militar de Moçambique para repôr a ordem e segurança na cidade de Lourenço Marques. Desta cidade enviou 2 aviões Nordatlas a Montepuez, a fim de levar o Batalhão de Comandos para Lourenço Marques.

Q Presidente Samora reagiu energicamente contra os tumultos, dando orientações para a retomada da guerra em todo o país. Com efeito, enviou uma mensagem ordenando que os combbatentes retomassem a guerra em todas as províncias. Nós, do Comando de Cabo Delgado, deveríamos regressar ao rio Lúrio e progredirmos até Nampula, como era nossa antiga pretensão. Ainda em Montepuez, o camarada Salésio recebeu a mensagem das mãos do nosso rádio-telegrafista, Cesário Nantimbo, tendo ido imediatamente à casa de banho, onde a leu. De volta, discretamente entregou-a a mim e,imediatamente, tive o mesmo procedimento. Eu passei-a ao camarada Domingos Fondo, que também teve, ironicamente, ironicamente, a necessidade de ir à casa de banho. Ficámos todos tristes!...

Esta mensagem tinha sido interceptada pelas Forças Armadas Portuguesas, cujo conteúdo era o seguinte: "Cabo Delgado, atravessar o rio Lúrio e introduzie a guerra na província de Nampula"

Os militares portugueses que interceptaram no QG em Nampula mensagem da FRELIMO , Da esqª para a dirª Cabo Cripto Pedro Silva, Capitão António Melo Carvalho e Cabo Cripto Victor Ferreira.

Na mesma manhã do dia 8, o comandante do Batalhão dos Comandos portugueses, Major Belchior, perguntou-nos sobre a preocupação do nosso presidente, sem se referir explicitamente à mensagem. Nos"fizmos ouvidos de mercador" a esta questão. Logo a seguir fomos transferidos do Palácio do Administrador para a casa do ex- agente da PIDE/DGS, localizada nas proximidades e considerada mais segura., tendo sido fortemente guarnecida por soldados portugueses. Foi nesta casa que esboçámos uma resposta àquela pergunta, que nos tinha sido colocada no Palácio do Administrador, mas, de forma indirecta.                                                                                                 Dissemos aos comandantes que se por acaso não quisessem continuar com a guerra, deveriam fazer isso por escrito, dirigindo a carta ao Presidente Samora Machel. Acrescentámos que o nosso emissário seria o camarada Domingos Fondi.  Mais uma vez, sem qualquer intenção de vaidade, sentia-me inserido no xadrez das grandes decisões da FRELIMO. Afinal era uma escola diplomática que percorria, pois os resultados viriam a contribuir positivamente para a libertação do País.      

Os portugueses fizeram a carta e esta foi, de facto, entregue ao camarada Fondo, o qual reve à disposição três Unimogs, que o levariam de regresso às matas. Duas das viaturas carregavam rações de combate e diversos produtos alimentícios para oferecer aos guerrilheiros, em manifestação de boa vontade..

Aconselhámos ao camarada Fondo para que calculasse bem o lugar em que deveria desembaraçar-se da tropa portuguesa, mandando-lhe de volta a Montepuez. Alertámo-lo para o facto de que se progredisse com ela mais para o interior, corriam o risco de serem abatidos pelas nossas forças, incluindo ele próprio, considerando-o de traidor. 
De modo que não se apercebessem da nossa agitação e, por seguinte, efectuasse algum tipo de controle sobre nós, informámo-la que no cume da montanha de Montepuez havia uma posição de fogo de artilharia de B-11-P 122 mm, pronta para destruir a Vila.

Depois de o camarada Fondo ter sido ido embora, arranjámos ouro pretexto para nos desfazermos da tropa colonial e regressarmos à Base Beira. Dissémo-la que naquela Base, os nossos camaradas não sabiam de nada a respeito do nosso paradeiro, se estávamos vivos ou não , pelo que precisávamos de ir ter com eles para lhes dar alguma satisfação.

Fomos compreendidos, ainda que com alguma desconfiança.No entanto, o Comandante do Sector enviou a Montepuez 2 aviões Dornier DO-27, a fim de nos levar para Mueda. Durante o voo, dois milicianos nossos, posicionados na mata de Nairoto, dispararam contra os aviões, mas sem os atingir. Havia-se programado uma banja (Reunião) para o Domingo, mas por se temer agressão de alegados simpatizantes da FRELIMO, sob proposta do Administrador, a mesma foi cancelada. Na sequência, o Administrador propôs a aquisição de roupa civil.

Com efeito, ainda em Montepuez tivemos que mudar de roupa, isto é, retirar o uniforme militar "pingo de chuva" e entregar um traje que nos tornasse desconhecidos. Optámos por calças na moda, na altura, o "pecus", mais conhecidas por "boca do sino". Este vestuário colocava-nos numa situação discreta, porque, em termos de conduta da FRELIMO, éramos proibidos usar este tipo de roupa. Assim, estávamos livres de qualquer suspeita,.Era um excelente disfarce!

De Mueda saímos de Jeep, em direcção ao ponto de partida e, a meio do caminho, apareceu-nos um sargento colonial pertencente ao ramos das comunicações. De repente, travou o seu carro e visivelmente ofegante, entregou uma mensagem ao Tenente Coronel Vilhena de Andrade. Este, depois de lê-la, passou-a ao camarada Silésio e este disse-nos que estávamos perante uma nova ordem, que deveríamos ir ao acordado em Lusaka se cumpriria. Porto aumentou a surpresa da guerrilha e lhe assegurou que restabeleceria a ordem e que Amélia, o que veio a acontecer.

A inquietação da FRELIMO em torno dos acontecimentos de 7 de Setembro, em Lourenço Marques, e a intercepção da mensagem de Samora é referida, nos seguintes termos:

A FRELIMO chegou a pensar que era uma manobra consentida pelos militares para impedir a descolonização. Para responder a esta preocupação o MFA contactou a FRELIMO interferindo nas suas próprias comunicações, o que 

É de salientar que, de Mueda seguimos para Porto Amélia, onde após o desembarque e, ainda no aeroporto, avistámos-nos com Lázaro Nkavandame, porém sem nos saudarmos. Passavam aproximadamente cinco anos que não nos víamos, desde a sua deserção, a 16 de Março de 1969.    Seguidamente fomos encaminhados para a residência dos oficiais portugueses, às 11 horas do dia 8 de Setembro, onde, surpreendentemente, encontrámos o camarada Alberto Chipande. Em resposta à nossa inquietação sobre a tomada do Rádio Club de Moçambique, em Lourenço Marques, este tranquilizou-nos, afirmando que já não havia guerra, que a mesma tinha terminado, em alusão à assinatura doas Acordos de Lusaka.

Chipande orientou Salésio para que fosse a Lourenço Marques e eu a Nampula, sob ordens do Presidente Samora Machel, emitidas a partir de Lusaka. Nesse dia, 8 de Setembro, às 0h30 minutos tinha sido feito o anúncio público dos Acordos de Lusaka.

Em Nampula, fui recebido pelo Comando Territorial Norte e acomodado numa das flats do bloco residencial, da Messe dos Oficiais.                                  
Ao jantar estive com o Capitão Afonso do MFA, alguns Alferes  Milicianos no Exército Português, como o caso de Luís Sacramento e Armando Chissano. Durante o jantar, fingi que  não tinha apetite, por recear envenenamento, mas como todos tivessem servido da mesma tigela, ganhei coragem. Porém, durante a noite tive insónia por causa do medo.

Refira-se  que o assalto às instalações do Rádio Club de Moçambique, foi acompanhado pela rádio-difusão de mensagem de protesto aos Acordos, assim como por marchas nas principais avenidas e ruas, acompanhadas de distúrbios. Na mesma altura, os populares assaltavam e saqueavam várias lojas, bloqueavam ruas e incendiavam viaturas, entre outras acções retaliatórias à atitude do MLM.

7 de Setembro de 1974. Ocupação do Rádio Club de Moçambique 



Reagindo às acções do MLM, o Presidente Samora Machel fez uma comunicação histórica, ao País e ao mundo, desdotacando, por um lado, o significado político dos  Acordos de Lusaka, e, por , advertiu os países vizinhos e a todas as forças imperialistas, para uma resposta violenta da FRELIMO, em caso de eventual ingerência nos assuntos políticos de Moçambique.

Visando a contenção dos tumultos e tomada de acções preventivas, a FRELIMO orientou as populações para o bloqueio logístico e contenção da circulação dos manifestantes, para o recolher obrigatório e, apelou à colaboração do MFA. As medidas foram traçadas nos seguintes termos:

1. A população deve bloquear todo o abastecimento e comunicações para o pequeno grupo de aventureiros fascistas, fanáticos e desesperados.
2. Os elementos inconscientes da população branca que foram manipulados pelos fascínoras coloniais -fascistas devem recolher imediatamente às suas casas, recusando a ser instrumento dos fascistas. É esta a melhor forma de defender os seus interesses legítimos que a FRELIMO se compromete a proteger.
3. A FRELIMO apela à Forças Armadas Portuguesas nas zonas urbanas, ainda não ocupadas pelas Forças Populares de Libertação de Moçambique (FPLM), para neutralizarem sem demora os reaccionários e agentes subversivos. impedindo, assim que venham repetir-se os oncidentes como os que acabam  de ter em Lourenço Marques.

Neste comunicado o Presidente Samora fez questão de realçar a confiança de que a FRELIMO gozava no seio do povo moçambicano, ao nível do continente africano e da comunidade internacional, em geral.
Com este gesto, pretendia mostrar que a independência era irreversível, pois ela contava com o apoio incondicional destes actores. Afirmou que a FRELIMO era amante da paz, razão porque se envolvera em dez anos de luta pela sua defesa, mas que não temia voltar à guerra, se estivesse em causa a liberdade e auto-determinação dos moçambicanos, enfim, a Independência Nacional.

Exteriorizando a consciência que a FRELIMO tinha a respeito da continuidado das sabotagens, entre outras acções inimigas, o Presidente Samora convidou os democratas portugueses a colaborarem.tendo salientado o seguinte:

Temos agora um inimigo comum que juntos devemos inexoravelmente a colaborar; os inimigos da Paz, os inimigos da amizade e cooperação entre Moçambique e Portugal. Este inimigo é controlado pelas raízes ainda não extirpadas do regime colonial fascista em MOÇAMBIQUE.

continua








                                          

segunda-feira, 6 de maio de 2024

2ª PARTE (7º CAPÍTULO) DO LIVRO: O FIM DA LUTA DE LIBERTAÇÃO NACIONAL EM MOÇAMBIQUE. "OPERAÇÃO OMAR" 1 DE AGOSTO DE 1974 . LIVRO DE ATANÁSIO SALVADOR TUMUKE

2ª PARTE (7º CAPÍTULO) DO LIVRO: O FIM DA LUTA DE LIBERTAÇÃO NACIONAL EM MOÇAMBIQUE.
8.4. Correspondência entre a FRELIMO e o Exército Colonial

O grau de "prostituição moral" a que haviam chegado alguns militares portugueses era preocupante. Estas palavras, saídas do próprio Presidente de Portugal, António de Spínola, tinham, na verdade, a real correspondência factual no "teatro de operações", em Moçambique, Como foi referido , enquanto o MFA Central empreendia contactos ao seu nível, localmente, tomava-se iniciativas à busca de cessar-fogo. Pelo conteúdo evidenciado na correspondência entre as partes, do lado colonial, é visível a fadiga ocasionada pela guerra e o desejo ardente  de os soldados portugueses se livrarem do que peremptoriamente qualificavam de conflito injusto e injustificável.

Refira-se que, na análise da correspondência, deparei com dificuldades para aceder a informações com datas sequenciadas, a partir das quais pudesse estabelecer uma relação lógica, entre as cartas e as  respectivas respostas. Porém, pautei por uma inferência, por um lado, as cartas enviadas para a FRELIMO e, por outro,  sistematizando as que nós enviámos para o Exercito Colonial.

 8.4.1. Cartas enviadas pelo Comando da Região Militar de Moçambique para a FRELIMO.

Lunho (Niassa) Cap. Salavissa da  CART. 7260 a confraternizar com a FRELIMO

O envio de cartas, grosso modo, data dos meses de Julho e Agosto de 1974. O seu conteúdo principal é o reconhecimento da legitimidade da Luta levada a cabo pela FRELIMO, o forte desejo do fim da guerra colonial, para o qual se solicita  a colaboração dos guerrilheiros.                 Constituem exemplos, as cartas que se seguem:

a) Carta de 26 de Julho de 1974, enviada pelo Gabinete do Comandante do Sector B, Batalhão de Caçadores 15 (Mueda) , Tenente Coronel António Manuel Andrade Lopes.

Esta carta faz referência  à recepção da carta da FRELIMO, enviada a 22 de Julho a Andrade Lopes. Este reitera o pedido de colaboração  na evacuação dos quartéis portugueses. Mostrando uma real e total abertura, acrescenta que os nossos guerrilheiros tinham as portas abertas ao Quartel de Mueda, salientando que:

A finalizar, convido alguns elementos desse comando provincial a virem a Mueda. Serão bem vindos! Sugiro que militares vossos, em pequenos grupos venham a Mueda de vez em quando, visitar as famílias, fazer tratamentos médicos, comprarem o que quiserem e confraternizarem. Podem vir armados. Apenas a entrada do quartel terão que entregar as armas que  lhes serão entregues quando desejarem sair.

b) Carta de 29 de Julho, enviada pelo Comandante de Nangade, Major Fernando Augusto Castilho Palma Ferro.

Trata-se de um aditamento à carta enviada ao Comandante Provincial de Cabo Delgado, Mateus Aníbal Malichocho, a 26 de Julho. Nesta, Fernando Ferro refere que fê-la, como uma forma de mostrar o seu espírito de cordialidade, nas suas palavras , como uma "Prova de Boa Vontade e Paz".
Nessa missiva, faz alusão à necessidade de esforços conjuntos no sentido de se proceder à evacuação de algumas unidades militares coloniais. A este propósito, Ferro escreveu que "Conviria que mandasse urgentemente a Mueda um grupo vosso para colaborar nas colunas que se vão realizar brevemente para a evacuação de Sagal e de Mocímboa do Rovuma.

c) Carta de 2 de Agosto, enviada pelo Comandante de Diaca, Capitão Armando Moreira Rodrigues.

De uma maneira geral, o Comandante de Diaca mostra, em nome de todos os seus soldados, a grande satisfação pela reacção da FRELIMO ao seu comunicado, bem como pelo envio de um emissário nosso àquele quartel, o que no seu entendimento, constitui uma forte premissa para o estabelecimento de um cessar-fogo local. Manifesta, também, a sua predisposição para receber os dirigentes do Comando da FRELIMO e ele mesmo, para se deslocar ao Departamento Tete, na Província de Cabo Delgado, comandado por Armando Chanjungu e, situado a cerca de 10 Kms do quartel de Diaca.
Informa, ainda, que ao nível do seu quartel já iniciou a sensibilização das populações confinadas no seu aldeamento, para regressarem para as suas terras de origem, porque a guerra findou. Eis alguns extractos:

Sensibilizados pelo conhecimento dado por vós ao nosso comunicado, queremos saudar-vos pela confiança em vós (nós) ao mandarem também um mensageiro a fim de serem iniciados  os contactos com vista ao restabelecimento das relações de amizade. Julgamos que a guerra em Diaca não tem razão de existir neste momento. "Recorde-se que o assalto ao Quartel de Omar tinha ocorrido no dia anterior" . Desejamos um rápido cessar-fogo. Estamos dispostos a ir também ao vosso encontro  se tal julgarem aconselhável. A população tem sido mentalizada no sentido da Independência, com a transferência de poderes para a FRELIMO. No entanto, julgamos útil a vinda de algund de vós a fim de falarem com a população.

Carta de 14 de Agosto, enviada pelo Comandante de Diaca, Capitão Armando Miranda Rodrigues

O comandante reitera dois aspectos, o primeiro, a FRELIMO como representante do povo e o segundo, a necessidade de o nosso Comando em Cabo Delgado colaborar na sensibilização da população sobre o fim da guerra, nos seguintes termos:

Este Comando tem envidado todos os esforços para quea população existente em DIACA possua uma visão realista e verdadeira do que é a FRELIMO como o único e legítimo representante do povo de Moçambique  que luta pela sua independência. Crê no entanto que este comando ser urgente a vinda a DIACA de um elemento qualificado da FRELIMO, que dirija pessoalmente a população, isto antes que se verifique a evacuação definitiva das nossas tropas desta área.

Aquartelamento de DIACA

 8.4.2. Cartas da FRELIMO enviadas para o Comando da Região Militar de Moçambique.

De uma forma geral, trata-se de cartas enviadas pelo Comandante Provincial de Cabo Delgado. Mateus Aníbal Malichocho, sob orientação da Direcção da FRELIMO. Estes documentos apresentam, basicamente, os mesmos conteúdos, dentre dos quais merecem atenção: 
1) as questões relativas à  Lei 7/74, de 27 de Julho
2) o incitamento à inquietação dos cidadãos de raça branca e dos soldados moçambicanos no Exército Colonial
3) a adopção de medidas com vista ao cessar fogo local (desmantelamento dos quartéis) 
4) a necessidade de libertação das populações dos aldeamentos
5) a relevância de sessões de educação cívico-patriótico para os soldados moçambicanos no Exército Colonial.
Assim sendo, são elucidativas as seguintes cartas

a) Carta enviada ao Comandante do Quartel de Mocímboa do Rovuma (Ngapa), Oficial Carlos Fernando Valente Ascensão Campos.

No que se refere à Lei 7/74 de 27 de Julho, nas cartas faz-se uma forte insistência para se qualificar as questões relativas à legitimidade da FRELIMO e a sua unicidade, tanto no processo negocial, como no acesso ao poder, pós-independência.. Estes elementos são referidos como condicionalismos para a retomada do processo negocial, com vista ao fim das hostilidades político--militares, nos seguintes termos:

Assim o Governo Português já reconheceu o direito do nosso povo à independência e ao mesmo tempo aceitou o princípio de transferências de poderes. Todavia, a posição do Governo Português ainda comporta ambiguidades. Essencial ambiguidade reside na definição de a quem transferir os poderes. A formulação utilizada "populações" ignora a realidade de como o nosso povo está organizado e estruturado pela FRELIMO, por isso é a FRELIMO legítimo e único representante do povo moçambicano, a quem devem ser transferidos os poderes.
Pela satisfação destas exigências fundamentais do nosso povo que seria possível iniciarem-se negociaç~~pes entre a FRELIMO e o Governo Português, conducentes ao cessar-fogo e estabelicimento de relações de amizade e cooperação entre os nossos países

Vista parcial do Aquartelamento de Mocímboa do Rovuma (NGAPA)

b) Carta dirigida ao Comandante do Quartel de Nangade, Major Fernando Augusto Castilho Palma Ferro.

Relativamente ao incitamento à inquietação dos cidadãos de raça branca e dos soldados moçambicanos no Exército Colonial, na carta lamenta-se o facto de alguns meios de comunicação social pautarem por atitudes tendenciosas. Com efeito, estes influenciavam as populações de raça branca, assim como os cidadãos moçambicanos, na tomada de decisão sobre o seu destino e onde viver , uma vez terminada a guerra colonial. Nas cartas, a FRELIMO lamenta a questão relacionada com o alegado mau tratamento aos cidadãos portugueses, especialmente nas zonas de conflitos militares. Enfatiza-se o facto de durante todo o período da Luta, termos pautado pelo cumprimento escrupuloso, tanto dos princípios ideológicos da FRELIMO, sobre adefinição do nosso inimigo, assim como dos dispositivos internacionais sobre questões humanitária, em zonas de guerra. Eis um excerto da carta:

Por outro lado, com uma certa apreensão verificamos que certos meios, para fins obscuros, demagogicamente, procurando especular sobre a sorte reservada, tanto às populações brancas em Moçambique, como aos soldados Moçambicanos no Exército Colonial. Nós durante dez anos amplamente testemunhámos a nossa firme adesão ao respeito e dignidade humana ...

c) Carta dirigida ao Comandante do Quartel de Nangade, Major Fernando Augusto Castilho Palma Ferro.

No que tange à adopção de medidas com vista ao cessar-fogo local, carta resume a predisposição de FRELIMO em colaborar no desmantelamento efectivo dos quartéis coloniais. Nesta altura, operacionalizava-se o ditado popular que diz que o "feitiço virou-se contra o feiticeiro", acima referido. Com efeito, no passado tinha sido o Governo Colonial a ordenar os seus arquitectos, engenheiros e soldados para a muito custo, estabeleceram quartéis e equiparem-nos. Agora, é a FRELIMO que inteligentemente "colabora" no seu desmantelamento, senão vejamos:

Há  poucos dias a nossa Direcção respondeu através do Presidente da FRELIMO, a vossa vontade de paz, expressando os largos sectores do Exército Português e da Administração Colonial.
Esta mensagem histórica do Presidente da FRELIMO constitui uma orientação segura e justa para a criação de zonas de paz, na província de Cabo Delgado´procedendo o estabelicimento do cessar-fogo. Dêem-nos o vosso itinerário de evacuações. Podemos a este nível determinarmos nomeadamente os corredores aéreos e horários a serem seguidos (...) Insistimos na necessidade de libertar as populações e as forças militares e militarizadas que se encontram nos campos de concentração (...) voltamos a chamar a atenção para a a necessidade dos moçambicanos serem autorizados a viverem nas Zonas Libertadas ou regressarem para suas casas (...) As autoridades civis e militares, publicamente, como foi o caso do Major Pachina, em Niassa, enviaram mensagens à Direcção da FRELIMO, apoiando o direito do Povo Moçambicano à independência e transferência de poderes para a  FRELIMO. Em outras regiões de Tete, Zambézia, Vila Pery (Chimoio) e Beira, atitudes construtivas semelhantes, conduziram à implantação de zonas de paz, onde os nossos combatentes, com o vosso apoio, se engajam na fase de reconstrução nacional.

NANGADE

Quanto à revelação de sessões de educação cívico-patriótica para os soldados do Exército Colonial, a premissa desta questão residia na manifesta falta de conhecimentos básicos a respeito do Golpe de Estado de 25 de Abril. São de se adicionar, as suas consequências no "teatro de operações", com enfoque para os últimos desenvolvimentos ao nível do MFA, sobre a sua libertação do regime colonial-fascista português. Enfatizando a importância deste aspecto, a FRELIMO redigiu um documento, com o seguinte teor:

Com profunda surpresa verificamos que os que os vossos oficiais e soldados que as nossas forças libertaram em Omar, ignoram quase totalmente os documentos básicos do MFA, que lhes tivemos que dar. Ignoram ainda, profundamente a evolução da situação política tanto em Portugal como em Moçambique. (...) Por isso, fazemos-lhes o apelo no sentido de facilitaremas vossas Forças Armadas o acesso aos documentos do MFA e a Imprensa democrática de Moçambique e Portugal.

A este propósito, na carta ao Major Fernando Ferro, em Nangade, pode ler-se "o Comando de Cabo Delgado envia-lhe os documentos :
1) Discurso do Presidente da FRELIMO  à XI Conferência de Chefes  de Estado e da OUA .
2) A abertura de nova Frente
3) Mensagem do Presidente da FRELIMO para os militantes e populações das zonas ainda ocupadas e para as praças, sargentos e oficiais portugueses em Moçambique
4) Comunicado Comum


8.5. Reacção do Exército Colonial face à Operação Omar

No dia do assalto ao quartel de Omar, o Comando-Chefe do Exército Colonial em Moçambique, emitiu um comunicado com a referência nº 43/74, que se resume na condenação à nossa atitude. Alegava que naquele momento tinham cessado os combates, o que na sua opinião se reforçava pela Lei 7/74 de 27 de Julho, sobre o reconhecimento do direito das colónias à independência. No entendimento do Comando, tornava a nossa atitude "irreflectida" e, finalmente, sublinha que a FRELIMO efectuou filmagens e fotografias, cuja finalidade era "fácil de adivinha".

Este comunicado, cuja interpretação oferece vários ângulos de análise, o aspecto lógico, é o que toma em consideração que, entre o Estado Português e a FRELIMO, ainda não se tinha chegado a nenhum compromisso político, capaz de impedir o assalto a Omar. Como referi, o primeiro contacto exploratório sobre as negociações aconteceram em Maio de 1974,, com a intervenção da Zâmbia e a ida de Aquino s Bragança a Lisboa. Ademais, nesse mês, o Presidente Samora ordenou que eu atacasse e ocupar o Quartel de Omar.

Isso significa que o relacionamento entre o Exército Colonial e os guerrilheiros da FRELIMO, no qual algumas correntes de opinião se embandeiram, não tinha qualquer sustentabilidade política, reflectindo somente o desgaste pela guerra, por parte dos primeiros, entre outras nuances geo-estratégicas.

A seguir aos contactos de Lisboa, as conversações subsequentes, com um relativo progresso, foram as de 5 e 6 de Junho de 1974. Porém, tanto estas as de 31 de Julho a 2 de Agosto, tinham ainda por resolver questões relevantes, tais como:

1) O reconhecimento da FRELIMO como legítimo representante do povo moçambicano  Propsta da FRELIMO)  ; 
2) Formação de um governo de transição com a duração de 4 a 5 anos, em que três quartos dos membros seriam nomeados por Portugal e um quarto, pela FRELIMO (Proposta de Portugal).
3) Fixação da data da Independência Nacional (Proposta de Portugal).

Assim, perante este estágio crítico de negociações, parece claro que se estava ainda numa fase sem compromisso político entre as partes. Não obstante a Lei 4/74, de 27 de Julho, para a FRELLIMO, era uma " simples manifestação de intenção"  do Governo Português, tanto mais que o próprio Presidente Spínola , constituía-se uma figura duvidosa, como se  confirmou posteriormente, quando  de forma reiterada se mostrou contrário aos princípios democráticos e anticoloniais do MFA. neste contexto, entenda-se que de Spínola anunciou uma lei que ele próprio não a assuma, guardando alguns trunfos, para os colocar à mesa das negociações, assim que fosse oportuno. Por outras palavras, sorrateiramente preparava a "Operação Referendo", enquanto nós estávamos atentamente empenhados na Operação Omar.

Este ponto de vista foi corroborado pelo Secretário Executivo da Organização da Unidade Africana (OUA), Major Hashim Mbita, que duvidava da sanidade política de Spínola, face à libertação genuína das colónias portuguesas. Por um lado, Mbita admitia que o mesmotivesse ideias neo-colonialistas, o que viria a constatar-se e, por outro, manifestava sérias apreensões quanto à agenda política africana do General Spínola. Mbita receava um conluio entre o Governo Colonial e alguns grupos emergentes na atmosfera política moçambicana, afastando o legítimo movimento de  libertação, a FRELIMO.

Considerando este cenário, de falta de compromisso entre os beligerantes, o assalto ao Quartel de Omar, para a FRELIMO, teve fundamentos políticos-militares. Recorde-se, no entanto, que antes deste assalto o regime colonial português era assistido por uma legislação que sempre defendeu a primazia da política, como condição sine quo non para a independência das colónias. Refiro-me, a título de exemplo, a Constituição Portuguesa de 1933 e a Carta das Nações Unidas de 1945. É neste âmbito que o Programa do Movimento das Forças Armadas (MFA), preconizava que o princípio de que a solução fas guerras no Ultramar é política e não militar.

Com efeito, a Constituição de 1933,no seu artigo 2, estabelece que:

O reconhecimento do direito à autodeterminação, com todas as suas consequências, inclui a aceitação da independência dos territórios ultramarinos e a derrogação da parte correspondente do artigo 1 da Constituição política de 1933. As resoluções 1514 e 1807, da Assembleia Geral das Nações Unidas, ambas de 4 de  Dezembro, mas de 1960 e 1962.

Convidada a analisar este comunicado, Modesta Daniel exibiu uma das melhores heranças dos jovens que estudaram à sua época a História de Portugal. Para o efeito, trouxe a lenda associada à Deus-La-Deu Martins, uma mulher que entrou no panteão dos heróis portugueses, pela audácia e coragem, em defesa da sua pátria, na altura a ser agredida pelos Castelhanos (Espanhóis).


Esta lenda, aplicada ao sucesso da Operação Omar, enfatiza a inexistência de acordo político entre Portugal e a FRELIMO, face ao complexo processo negocial pela Independência Nacional. Ao mesmo tempo, recorda-nos as manobras dilatarias engendradas por Spínola, quando pretendia empurrar a FRELIMO para um Referendo.

Modesta Daniel, esposa de Armando Abel Assikala

Em destaque, General António de Spínola



CONTINUA


















































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