Há um certo hábito, que pessoalmente considero algo
mórbido, de celebrar a vida das pessoas, assinalando não o dia em que nasceram,
mas o dia em que morreram.
Em Portugal, já no século XX, em plena ditadura
salazarista, e a partir dum mais ou menos obscuro feriado republicano celebrado
em Lisboa após o derrube da monarquia, inventou-se um feriado nacional digamos
que “isento de pecado” para o qual, provavelmente por uma questão de economia,
se arrolaram mais temas, se achou dever passar a ser o “Dia de Portugal”.
Temática que, consoante de onde os ventos sopravam, e
sendo sempre o Dia de Camões, era, por acrescento, o Dia da Raça, o Dia das
Forças Armadas (durante a Guerra Colonial), e, mais recentemente, o Dia das
Comunidades Portuguesas (aka os emigrantes).
Para que conste, o dia 10 de Junho do Ano de Deus de
1580, foi, segundo os registos, o dia, numa terça-feira, em que o poeta
português do séc. XVI, Luis de Camões, que compôs, entre outros, a épica Os
Lusíadas, em que hiperventila majestosamente em poema, os portugueses
daquela altura, morreu na cidade de Lisboa. Tinha 56 anos de idade. Na
realidade, não se sabe em que data ele nasceu.
Mas no caso de Moçambique, e do Dr. Eduardo Mondlane,
sabe-se perfeitamente que ele nasceu na localidade de Manjacaze (Gaza) num
domingo, dia 20 de Junho de 1920. Seria simpático, a meu ver, celebrar essa
data, se se quiser celebrar a sua vida, e não o dia em que uma carta-bomba
entregue não se sabe bem como e não se sabe bem por quem, em casa de Betty King
na capital da Tanzania, Dar-es-Salaam, ceifou a vida do então Presidente da Frente
de Libertação de Moçambique.
Como exemplo do que falo, temos o caso do Dr. Martin
Luther King, Jr., americano, que faleceu (também assassinado) no dia 4 de Abril
de 1968, mas cujo feriado nacional, improvavelmente instituído pela
administração de Ronald Reagan nos anos 80 do Século XX, foi fixado para o dia
em que ele nasceu – 15 de Janeiro (ele nasceu em 1929).
Mas quem sou eu para discutir feriados, aliás um tema
muito na moda em Portugal estes dias, em que os hiperdinâmicos rapazes de Pedro
Passos Coelho estão num verdadeiro frenesim para arranjar formas de extrair
mais trabalho e impostos da populaça, incluindo -claro- a eliminação de nada
menos que quatro feriados nacionais, pontes, férias e coisas afim.
Em Moçambique, o dia 3 de Fevereiro, que este ano
decorreu ontem, é o Dia dos Heróis de Moçambique. O critério de base para se
ser herói em Moçambique até esta data (e que ser feito por decreto
governamental) tem necessariamente que incluir ter-se andado aos tiros na
guerra pela Independência – excepto o caso do Sr. José Craveirinha, que usava a
caneta.
Efeméride que, afinal, se calhar era mais
adequadamente celebrada no dia 25 de Junho, a data em 1975 acordada (ver item 2
do Acordo) entre a Frelimo e os representantes do então governo provisório de
Portugal em Lusaka (por proposta da Frente, claro) para a formalização da
independência do então território português.
Ainda que, na realidade, e nos termos dos pontos 3 e 7 do mesmo Acordo,
que foi anunciado na noite do dia 7 de Setembro de 1974, a Frelimo
efectivamente passou a governar Moçambique no dia 21 de Setembro – apenas 14
dias após a assinatura do Acordo em Lusaka – com uma equipa cujo elenco incluia
individualidades conhecidas como Armando Emílio Guebuza, o Dr. Mário Fernandes
da Graça Machungo e Joaquim Chissano – o primeiro e o terceiro por inerência
futuros “heróis”.
3 de Fevereiro é o dia em que o Dr. Eduardo Mondlane
foi assassinado.
Mas aqui em baixo, assinalando a data, e questões
“feriadais” aparte, venho recordar a vida de Eduardo Mondlane, com umas fotos
que algo laboriosamente restaurei.
Mondlane nos tempos de estudante no Oberlin College na Amérca |
O Rev. Uria Simango, então creio que nº2 da Frelimo (e pai de David Simango, actual líder municipal da Beira) com o Dr. Mondlane.
Eduardo-Chivambo-Mondlane |
O funeral do Dr. Mondlane em Dar, após o assassinato, Fevereiro de 1969. Na imagem podem-se ver Julius Nyerere, então líder da Tanzânia, creio que quem está a falar é o Rev. Uria Simango, ao fundo em primeiro plano a família Mondlane, as duas filhas, Janet e Eduardo Jr.
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