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Livros da guerra colonial

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domingo, 2 de novembro de 2025

6.3. O fim das ofensivas no Niassa

 6.3. O fim das ofensivas no Niassa 

Em 1974, as forças guerrilheiras da FRELIMO mantiveram o fogo permanentemente aceso contra as forças ocupacionistas portuguesas e estavam decididos a cumprir a sua missão libertadora. As maiores hostilidades tiveram lugar nos meses de Fevereiro a Julho de 1974 onde são destacados ataques ao posto de Namirrupa onde vários soldados portugueses foram mortos e material bélico capturado. Nos dias que se seguiram, foram realizados vários ataques a postos avançados e veículos militares que saiam da Vila Cabral a Chala com recurso a minas anticarro. O  relatório de 8 de Fevereiro de 1974 do Comandante da Defesa do Batalhão de Caçadores 4811, Manuel Rui Passos Pereira, faz referência a um ataque que teve lugar as 18:00 horas do dia 6 de Fevereiro no Aquartelamento Valadim  aldeamentos dos Grupos Especiais de Mataca que começou com o rebentamento do Valadim e houve reacção da tropa portuguesa. Em um outro Relatório circunstanciado nº 1/74, sobre as mesmas ocorrências, o Comandante do Batalhão de Caçadores 4811 Armando de Sousa Gomes, refere que um numeroso grupo de homens da FRELIMO (entre 100 a 200) flagelou o aquartelamento de Valadim e os aldeamentos dos Grupos Especiais 102 e de Mataca, usando agrupamentos de armas pesadas onde segundo a perícia feita, tratou-se de armas do tipo morteiro 82, canhão B-10 calibre 82 mm e uma ou mais armas automáticas. O mesmo comandante argumenta que o ataque teve lugar porque os atacantes instalaram as suas armas no limite máximo do seu alcance e em cotas elevadas em relação ao aquartelamento e que os armamentos existentes no seu aquartelamento eram de menor calibre e de menor alcance em relação aos utilizados pelo grupo atacante. No final da guerra, as tropas portuguesas no Niassa mostravam-se cansadas de lutar numa guerra que eles consideravam invencível e injusta, começaram a expressar descontentamento e sem vontade continuar a combater. Mas, ״nós ainda tínhamos forças e armamento suficiente para combater, tínhamos muitos homens do nosso lado e estávamos a ficar mais organizados”.  As tropas portuguesas aperceberam-se que era a Europa e não as colónias africanas que serviam de principal parceiro da economia portuguesa e por isso não havia um fundamento lógico para o arrastamento da guerra. Estes relatos indicam que até 1974, a FRELIMO já dispunha de material bélico de grande calibre e com capacidade suficiente de enfrentar ou mesmo derrubar alguns aquartelamentos do exército colonial português. Associado a este facto, o relatório de 8 de Fevereiro de 1974 do Comandante da Defesa do Batalhão de Caçadores 4811, Manuel Rui Passos Pereira, também da a entender que haviam informações que previam um ataque de grande envergadura, dado que foi admitido que as flagelações eram uma simples acção de diversão para provocar o ordenamento de toda a reserva de combate dos aquartelamentos, o qual seria seguido de acções de maior violência por parte dos atacantes. Ao longo do período em questão, foram levados a cabo pelos guerrilheiros da FRELIMO, uma série de acções de sabotagem que culminaram com baixas humanas e materiais nas áreas de Vila Cabral e Nova Freixo (actual Cuamba). A título de exemplo, no dia 24 de Fevereiro de 1974 e seguintes, sapadores da FRELİMO, desdobraram-se em acções de sabotagem a infraestruturas ferroviárias tendo destruído a linha férrea entre Cuamba e Chipa em vários lugares numa área de 4km, destruição completa da Linha férrea entre Lussiwe e Catur. 


Com estas acções, é notório que os guerrilheiros da FRELIMO continuavam a intensificar a guerra popular e revolucionária e conforme descrições do mesmo autor, os combatentes e a população das zonas libertadas receberam com agrado a determinação da Direcção máxima da FRELIMO . Vai dai que as operações dos guerrilheiros, contavam sempre com o apoio de determinados elementos das comunidades para materializar as suas acções de combate, fornecendo tubérculos para alimentação e informações essenciais. A fase final das ofensivas dos guerrilheiros no Niassa, tem lugar em Maio de 1974 e estende-se até Julho altura em que, um campo militar português entre Malemia e Matenda, perto da Vila Cabral foi fortemente bombardeado e os guerrilheiros tomaram o Quartel, com um rescaldo de 14 soldados portugueses abatidos e quantidade de material de guerra capturada. No mesmo intervalo, tiveram lugar outros combates nos quarteis de Lupiliche, Maniamba, Machomane, e outras estradas. Face as investidas dos guerrilheiros da FRELIMO, em Abril de 1974, as forças armadas portuguesas empreenderam ataques as bases da FRELIMO no Niassa Ocidental que culminaram com a morte de Comissário Politico Provincial Bernabé Kajika e ficaram feridos 11 guerrilheiros. Em retaliação, os guerrilheiros da FRELIMO prosseguiram com ataques e operações de sabotagem tendo a 10 de Junho destruído o quartel da Administração de Maniamba, destruíram uma extensão de 1.200 metros de linha-férrea entre o rio Luchimwa e Nova Freixo. A situação político-militar, assentava ainda num acordo de cessar-fogo, que obrigou os aquartelamentos da tropa portuguesa que ainda restavam, como em Pauila e outros em procedimentos de retirada e abandono de instalações, promovendo a entrada naquelas instalações, dos guerrilheiros da FRELİMO. Em síntese era esta a realidade em diferentes locais onde decorriam guerrilhas e ataques a aquartelamentos. É certo que o cenário de guerra em Moçambique tendia a complicar-se, assumindo novos contornos em que de um lado havia motivação de que a vitoria era certa, mas do outro lado, a  desmotivação era crescente. A tropa colonial recusava-se a combater e nada lhes acontecia. Ficava assim concluído que havia uma impotência na continuação da guerra. E vale referenciar que, com a guerra em Moçambique, Portugal teve custos humanos, financeiros, materiais, morais e políticos bem maiores. Considerações finais A autoridade política da FRELIMO no Niassa foi implantada com recurso ao discurso do movimento de libertação que era difundido no seio das populações de forma clandestina, individualmente e em pequenos grupos, destacando-se professores, catequistas, alunos das missões católicas, autoridades locais e de mais elementos das comunidades. Estas acções foram materializadas através de panfletos com dizeres revolucionários e que incentivavam a população a aderir aos seus ideais. A acção e o discurso usado no início da luta de libertação, por elementos da FRELIMO no Niassa, para mobilizar as massas a se juntar ao movimento em prol da luta de libertação de Moçambique revelou, de alguma forma, a falta de conhecimento de como organizar e mobilizar as massas e que palavras de ordem deviam ser formuladas. No contexto da formação da autoridade política da FRELIMO, recorreu-se ao uso do discurso motivador para a população que era incentivada e moralizada a se juntar ao movimento de libertação, e um dos discursos dizia que ̋a guerra não levaria muito tempo”! Mas dentro da Linha política da luta armada referenciado por MACHEL (SA: 33) considerou-se errado e muito grave qualquer tentativa de enganar as massas com promessas de victorias fáceis e rápidas ou ainda de lhes mentir sobre os fracassos ou sucessos alcançados, pois este tipo de accão bloqueia a elevação da compreensão política das massas para analisarem e sintetizarem as experiências colectivas e assim aprofundar e desenvolver o pensamento político e estratégico do movimento tanto como melhorar as tácticas. Uma das formas da visibilidade de autoridade política da FRELIMO no Niassa foi a criação das zonas libertadas, marcadas pela ausência militar e administrativa ou libertada das estruturas de dominação capitalista-colonial. Eram zonas em que ao nível administrativo, o poder já não era exercido pelos administradores coloniais, nem pelos régulos tradicionais. As formas, métodos e conteúdos do poder foram transformados e o quotidiano passou a ser orientado e dirigido pelas palavras de ordem dos guerrilheiros da FRELIMO. Eram zonas que resultavam também do trabalho político de consciencialização das massas. Constituiu o primeiro sinal de aceitação da autoridade da FRELIMO na região. 193 Para assegurar a permanente formação de autoridade política, a FRELIMO valeu se da educação dupla dos seus combatentes (Político-militar), devia ser um homem que domina a arma e a política em função da realidade moçambicana, por isso que o essencial na preparação dos seus quadros só podia ser feito por Moçambicanos nas suas próprias bases de instrução ou estágios relativamente curtos em países amigos revolucionários onde aprendiam novas técnicas e enriqueciam a experiência teórica e pratica da revolução. Do trabalho de campo realizado, foi possível perceber que a formação da autoridade política da FRELIMO esteve alicerçada na sua propaganda ideológica e na sua grande e segura base social. Associado a estes elementos, deve se referir a capacidade de coerção dos guerrilheiros, sempre que deparassem com alguma rejeição da população ou figuras por eles consideradas preponderantes para as suas acções e interesses. O trabalho político preparatório da FRELIMO foi bastante essencial para a sinalização da autoridade que se pretendia, geralmente realizado entre as populações residentes na fronteira com a Tanzania (seu bastião) mesmo no início da década sessenta, e foi uma característica fundamental da estratégia da FRELIMO em toda a luta enquanto as forças de libertação avançaram para o interior. A população ao aceitar a autoridade da FRELIMO transformou-se numa fundamental base de apoio para a luta de libertação, na medida em que foi acolhendo os guerrilheiros nas zonas de combate, no transporte de material de guerra, protecção dos guerrilheiros das incursões das tropas e das autoridades coloniais, fornecendo informações sobre o seu movimento nas aldeias e proximidades. No decurso da formação da autoridade política da FRELIMO no Niassa, houve necessidade de engajar largamente as massas nas frentes de combate, para tal, foi necessária que as forças de vanguarda empreendessem um trabalho político prévio com vista a mobilizar e organizar as messas. Este trabalho foi levado a cabo de forma continua visando elevar o nível de compreensão política das massas para que estas assumissem cada vez mais e profundamente a natureza, os objectivos e métodos da guerra e assim facilmente poderem superar as inúmeras dificuldades. 194 As banjas realizadas nas comunidades constituíram ocasiões importantes para emissários e guerrilheiros disseminarem implissitamente os objectivos, estrutura, método de trabalho e visão da FRELIMO incluindo a disseminaçqo da sua autoridade. Os estudos sobre a luta de libertação em Moçambique apresentam-se nitidamente ainda não concluídos. Certamente que já foram dados importantes passos, mas é difícil afirmar, seja o que for com carácter perentório. Existe um número considerável de aspectos a analisar nesta questão e que merecem profundos estudos, e consequentemente uma larga escala de cenários possíveis se abram. Dai haver necessidade de identificação de algumas variáveis importantes por estudar que podem ajudar a compreender melhor o desenrolar dos acontecimentos em diferentes cantos de Moçambique no contexto da luta de libertação em Moçambique e não África Austral. A unidade do povo moçambicano incentivada pelos guerrilheiros da FRELIMO e suas lideranças, constituiu um dos factores fundamentais para o alcance da independência de Moçambique principalmente ao se incutir nas mentes das populações que a luta armada não era contra o povo português, mas sim, contra o regime colonial que vigorava em Moçambique e que para o seu derrube era necessário a união e coesão do povo para fazer frente o regime. Este factor incentivador pode ser visto como o galvanizador da aceitação que a FRELIMO teve no seio das populações na região do Niassa. No Niassa, a luta de libertação, foi levada a cabo pelas massas que abdicaram de diferentes afazeres para libertar a terra e o homem, envolvendo-se nas diferentes tarefas que a luta exigia, destacando se o combate armado, a produção, transporte de material bélico, reconhecimento do inimigo, fornecimento de alimentos aos guerrilheiros e até indicação de abrigos seguros, o que tornou possível superar as inúmeras deficiências e chegar a vitoria. A guerra no Niassa provocou uma fuga em massa das populações para territórios limítrofes com destaque a (Malawi e Tanzânia). Entre 40% de Ajauas e 50% de Nianjas deixaram de estar sob autoridade portuguesa. ̋Em 1966 encontravam-se na ilha de Likoma cerca de três mil refugiados nianjas, quase todos da área do Cobué. Também havia refugiados em campos no sul da Tanzânia”, (CASTELO, 2009;09) As zonas rurais foram as áreas de maior atuação (mobilização) e preferência da FRELIMO pelo facto de ser nelas em que a maior parte da população vivia (90%) e as zonas urbanas terem sido 195 povoadas sobretudo por colonos e foram concebidas de maneira a isolar e acantonar facilmente a população africana que aí se encontrava. Dai que as zonas rurais onde a tropa colonial era diminuta quando comparado com a zona urbana, mostrou-se ser fácil o acesso para os guerrilheiros e por isso é que a luta de libertação teve inicio na zona rural. Lutando nas zonas rurais onde a população moçambicana era numerosa, os guerrilheiros estavam levando a tropa colonial para áreas do seu domínio. A guerrilha ̋obriga o inimigo a combater no seio do povo que lhe é hostil”. A independência de Moçambique resulta de um conjunto de factores! Referenciar a acção dos países africanos em particular os da OUA que constituiu o factor decisivo no isolamento do colonialismo português e o reforço da solidariedade internacional para a luta de libertação em Moçambique. Mas, o elemento importante e fundamental que desmoronou o sistema colonial que vigorava em Moçambique, no nosso entender, foi o desenvolvimento do movimento contra a guerra colonial de agressão que teve lugar em Portugal, pois a população portuguesa passou a ter informação das baixas que eram infligidas às tropas coloniais e vivenciaram a subida vertiginosa do custo de vida em consequência da guerra, estes e outros acontecimentos, combinados, conduziram à tomada de consciência por parte das largas massas e partiram para a luta contra a sistema colonial que predominava em Moçmbique.

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